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Vareta Funda

O blog dos orizicultores do Concelho de Manteigas


sexta-feira, fevereiro 27, 2004


De orelhas em pé - XI

Esperneou a oposição quando soube que o admirável Santana Lopes beneficiava de uma mordomia reservada às grandes figuras de Estado - a protecção policial a expensas do erário público. Esperneou, não porque se sinta ofendida com a aparente ilegitimidade da medida, mas porque é adepta da táctica da rasteira, do empurrão pelas costas, da cotovelada na costela, muito à imagem do futebol que temos (já vão ver porque falo de futebol...). À falta de argumentos que mobilizem o povo num projecto de união nacional que arranque o país dos braços da depressão medicada em que está enterrado, atacam-se as figuras, procuram-se os podres, diz-se, no fundo, "olhai, eles ainda são piores que nós".

O improvável edil declara gravemente que há coisas com que não se brinca, que há ameaças à integridade física, filhos que convém defender. E, pasme-se, evoca a memória. A memória de um Primeiro-Ministro morto num acidente de aviação com causas ainda não definitivamente explicadas, no que constitui uma das maiores vergonhas da República Portuguesa.

Dando de barato a insinuação imprudente de uma figura política num campo que não lhe diz respeito - o da Justiça - gostaria de, aqui, complementar a memória que agora evoca o rapaz, acrescentando-lhe uns episódios. Gostava de lhe lembrar as duas vezes que prometeu deixar a política e não cumpriu. E gostava, sobretudo, de lembrar-lhe que quando foi presidente do meu clube usou o mesmo expediente das ameaças de morte. Chegou até a convocar uma conferência de imprensa para exibir as provas de tais ameaças - que mais não eram do que a publicidade a um livro ("Cuidado com os Rapazes", Alface) que lhe foi colocada na caixa de correio. A memória é uma coisa lixada.

Tem toda a razão Santana Lopes quando diz que há coisas demasiado sérias para que se brinque com elas. Mas, a menos que ele seja um caso singular no meio das figuras públicas portuguesas, sendo o único ameaçado de morte, podia começar por guardar algum recato quanto às matérias que lhe não parecem adequadas a brincadeiras. Isto, claro, supondo que quem tenha alguma memória ainda o leve a sério.


É SEXTA-FEIRA E ESTÁ FRIO...

E como nevou na Serra da Estrela, lá devem partir as famílias portuguesas em romaria para ver esse fenómeno fascinante... E depois ficam roxos de frio e molhados e desconfortáveis mas dirão sempre que se divertiram muito e que gostam da neve. As farmácias abastecem-se de antigripais, vendem-se vários sucedâneos de Queijo da Serra e há uma ou outra fractura exposta para dar que fazer aos ortopedistas. É uma alegria!

Assim, aproveito a ocasião para vos dar a ler, na língua de Herculano e de Brandão, mais uma pérola da lírica pop contemporânea, homenageando desta feita um canadiano de boa cepa a quem os pais chamam Matthew Adam Hart mas a quem o mundo inteiro conhece por The Russian Futurists.


"It's Not Really Cold When It Snows"



We used to marvel at the way the snowflakes looked
Ficas com ar de parola quando vês a neve a cair
Under the setting sun until we (were) getting numb
Depois queixas-te que não sentes os dedos...
But could we find the two that matched like me and you?
Achas que esses bonecos de neve estão parecidos connosco?
Well I won't answer that 'cause there's no chance of that
Mais parecem o cravo fálico do Cutileiro!

But now come on girl, it's not really cold when it snows
Vês?! Já estás a espirrar! Eu bem te disse que ía estar frio!
Get outside, it's not really cold when it snows,
Passas a tarde acarvada na neve... depois dá nisto!
I still love you, it's not really cold when it snows unless you're underdressed
Não é que eu me aborreça, mas avisei-te para vires mais agasalhada, não foi?

We used to marvel at the way houses looked back
Estas casinhas de madeira na Serra não são nada mal jeitosas...
When they had peaks of white and endless seas of lights
Com os telhados cobertos de neve e a lareira acesa lá dentro
And trees without their leaves had led us to believe
Mas assusta-me a perspectiva de ficarmos presos lá dentro
The wind and heartless cold had frozen lightning bolts
Condenados a uma creogenia involuntária.

And their arms reach out to the dancing snowflakes
Se continuas a dançar na neve ainda pensam que és uma drogada!
They spin like kids skating on frozen lakes
Mais valia termos ficado em Lisboa, na pista de gelo do Dr. Santana
And they know that it's not really cold when it snows unless you're underdressed
E ao menos aí podias andar com roupinha mais leve

And we could keep our books on how the snowflakes looked
Eu sei que tu gostas de desenhar estas paisagens com neve
Under the setting sun until we're getting numb
Mas o sol já se está a pôr e a viagem ainda é longa
But could we find the two that matched like me and you?
Sabes que somos dois desorientados e o mais certo é perdermo-nos
Well I won't answer that 'cause there's no chance of that
E nem penses em ficar cá mais uma noite que o dinheirinho custa a ganhar!

But now come on girl, it's not really cold when it snows
Bom... frio? Não tenho assim muito frio...
Get outside, it's not really cold when it snows,
Achas que sim? Ficamos quentinhos se estendermos aqui o saco-cama?
I still love you, it's not really cold when it snows unless you're underdressed
Então, vá. Despe-te que isto hoje vai ser trepidação até causarmos uma avalanche!

The Russian Futurists, Let's Get Ready to Crumble



quinta-feira, fevereiro 26, 2004

Alambridatia, 8

- E Budapeste?
- Budapeste? Que é que há em Budapeste?
- Ora, que pergunta! É uma das cidades mais bonitas do mundo. As avenidas, os palácios, a arquitectura. Respira-se erudição.
- Não me parece... e se fosse Ibiza?
- Ibiza?!? Que nojo! Montes de ingleses semi-analfabetos e ruidosos a comportarem-se como se estivessem em casa...
- Mas tem praias lindas. E imensa animação.
- Praias temos nós por cá, para quê gastar um dinheirão indo lá para fora?
- Boa ideia! Podíamos ir para o Algarve!
- O Algarve é um caos turístico completamente descaracterizado. Antes irmos para o litoral alentejano, Odeceixe ou Aljezur. Há lá uns tipos giríssimos a recuperar moínhos e estilos de vida tradicionais.
- Mas as praias ficam longíssimo!
- Podíamos ir de bicicleta, ou caminhar. A beleza rude daquelas falésias é devastadora.
- E, além disso, não há mais nada para fazer.
- Se queres fazer “coisas”, porque não Viena? Temos os concertos, a ópera, os museus...
- Porra, mas não há mais ninguém, e o meu conceito de diversão em férias não é bem esse...
- Em contrapartida, passávamos as férias com pessoas que nos são culturalmente afins.
- Pois. O meu medo é mesmo esse.

sexta-feira, fevereiro 20, 2004

HOJE É SEXTA-FEIRA E AMANHÃ É VÉSPERA DE DOMINGO GORDO!

E o que é que isso me interessa?... Nada, confesso. O Carnaval diz-me pouco. Não gosto desta imposição do calendário: agora têm três ou quatro dias para se divertirem muito e serem uns grandes malucos! Divirto-me quando quero e como quero e, no que toca a máscaras, já ando toda a semana mascarado de funcionário público.

Temos, portanto, que para mim este é um fim-de-semana à semelhança de outros. Tanto ou mais que 2ª feira tenho de trabalhar: qualquer sonho de ponte que eu alimentasse teve um fim à Hintze Ribeiro...

Ainda assim, é Carnaval. Uma época de folia e folguedo. Que vos poderia eu sugerir que não um mergulho de cabeça na euforia e na vertigem de máscaras e serpentinas e balões de água? Sim, o quê? Nada.

Daí que tenha optado por partilhar convosco uma canção melancólica, sofrida e algo neurótica. Hoje tenho a honra de dar a ler ao falante da língua de Antero e de Pascoaes um poema de Mark Eitzel. Esse mesmo, o dos American Music Club e da inconstante e fértil carreira a solo. Este "Western Sky" é uma canção brilhante, qualquer que seja a leitura: foi gravada com os AMC e foi revista o ano passado no álbum a solo The Ugly American de forma absolutamente genial. Será a banda sonora perfeita para Quarta-Feira de Cinzas, quando sobre vós tombará uma enorme ressaca e a consciência da Quaresma...

Western Sky



Time for me to go away
O prazo de validade disto já caducou, não é?
I'll get a new name, I'll get a new face
Quando passares por mim na rua não me vais ver nem me vais falar...
Time for me to go away
Eu sei que estas merdas não vêm com livro de reclamações.
No I don't belong in this place
E eu esqueço-me... eu consigo esquecer tudo o que não me apetece lembrar.

But I'm not gonna ask you why
Não vou perguntar-te o que é que se passou
You think the parade has passed you by
Sei tão bem como tu que o nosso Carnaval acabou
Or if everything good is gone into the western sky
O que houve de bom eu levo para o sítio - um qualquer - para onde vou

I hate to see you look that way
Pois... não te é difícil deixares-me transtornado nestes dias do fim
All the beauty has left your face
Talvez seja pedagógico ver a tua cara a sofrer com o peso das decisões
That's such an easy thing to give away
É muito mais fácil não te achar bonita, assim
That's impossible to replace
E já só guardo esta imagem de ti, sem lugar a substituições

So I'll take you in my two weekends
Vamos só passar os dois fins-de-semana à Quarteira porque já gastámos o dinheiro no time-sharing
And I'll throw you so high
E talvez te ensine mais uma coisa ou duas...
Watch you fall forever in the western sky
E no fim acenas-me, contra o céu algarvio... são mãos bonitas, as tuas
And when you land you'll turn into some kind of prize
Quando baixares o braço e ficares sozinha vais ser um troféu de caça para algum galifão que por ali ande
Into somebody's sweet prize
E eu vou armar-me em galifão para outro lado

I won't see you no more
Depois da Quarteira não te vou ver mais
Who am I to rate that high
Não vou fazer juízos sobre o que se passou - não vale a pena, não é?
The world's a shadow of what went before
Um dia os dias contigo ou sem ti vão-me parecer iguais
The world gives off none of its own light
'Inda faço como o irmão do outro e compro um cabriolé

So please be happy baby
Portanto, minha linda, desejo-te saúde e sorte.
And please don't cry
E de que é que te vale chorar, afinal?
Even though the parade has passed us by
Devias rir-te... é Carnaval!
Well you can still see it shining in the western sky
Sofrer já não faz parte dos padrões da civilização Ocidental.
So why won't you stop crying
Não chores... fica-te mal.
You can still see it shining
Lembra-te antes do pôr do sol na Praia do Carvalhal.

Mark Eitzel, The Ugly American

E que tal, hein? Uma tradução quase sem vernáculo, quase sem carga lúbrica, quase sem piadolas... Lá está: é Carnaval, nada parece mal! Bom fim-de-semana.



Eu queria escrever sobre a solidariedade

Ter as palavras certas para exprimir o que sinto acerca deste estado de espírito, ou será sentimento?
Conseguir descrever a comoção quando presencio a solidariedade de alguém.
Justificar com palavras, as lágrimas nos meus olhos quando sou cúmplice de um Ser solidário.
Perceber a motivação de quem se tira de cuidados e vai fazer alguma coisa por alguém que não conhece.
Dar tempo próprio a desconhecidos.
Despender serão, sofá e televisão.
Com desprendimento, dar sem receber.
Perceber esta via de sentido único.
Mais nobre que a amizade.
Mais honesta que a religião.
Anónima.

Pensando bem, eu queria era que alguém traduzisse o meu sentir, já que não o consigo exprimir.

quarta-feira, fevereiro 18, 2004

18 de Fevereiro de 1908



O meu avô nasceu há 96 anos. Foi uma terça-feira. Era o quarto de seis filhos que os meus bisavós geraram. Nasceu no concelho de Ferreira do Zêzere. E viveu lá até que pôde, se descontarmos o serviço militar. Hoje divide o tempo entre Ferreira do Zêzere e Tomar, que é como quem diz entre as casas do filho e da filha. A filha dele é a minha mãe. Pronto.

O meu avô - o único que conheci, o outro morreu novo, novo demais - faz hoje 96 anos. Tem dois filhos, quatro netos e três bisnetos. É viúvo. É pensionista. Tem um glaucoma. Quase não vê. Usa bengala. Tem o cabelo branco mas mesmo branco. Tem o nariz longo. Tem um riso inimitável. Tem um sentido de humor como poucos.

O meu avô chama-se Américo. Casou aos 27 anos - cedo demais, reconhece. Não terá sido sempre fiel, mas só a morte o separou da minha avó. Trabalhou no campo, agricultor de subsistência, imagem padronizada do minifúndio do Ribatejo Norte. Tem orgulho em que os meus pais não tenham vendido as terras que eram dele. E eu também.

O meu avô ensinou-me muito. Mais do que ele pensa. A paciência, a bonomia, a inutilidade de certas discussões, o poder apaziguador de uma piada ou de um outro tema de conversa. E outras coisas... Lembro-me de passear com ele em Tomar, tinha eu uns 15 anos, e de ele comentar sobre uma senhora que passava: "Hum... Deixa estar que esta também apanhava com seis pastéis de nata a ferver pela conaça adentro!". Tinha 83 ou 84 anos, na altura, mas ainda se "lembrava"...

Sempre gostou de mulheres. E de vinho. E das suas terras. Dos seus animais, ainda que se enfurecesse com facilidade com a teimosia da mula, a Carriça. De conversar. De inventar umas patranhas. De jogar às cartas. Nunca aprendeu a ler ou a escrever. Mas aprendeu outras coisas: sabia fazer poços, sabia levantar paredes e muros, sabia quando havia de semear e de colher. Serviu-lhe.

O meu avô faz hoje anos e está feliz. Falei com ele. Sente-se bem com a vida que teve e gosta ainda da vida que tem. Não tem "casos pendentes". Foi um bom pai, gerindo como podia a carestia. É um grande avô. Não percebe que raio de curso é que eu tirei - se não é médico nem advogado nem engenheiro é o quê?! - mas tranquiliza-se porque tenho um emprego. Gosta de mim. Gosta que lhe dêem atenção e que o ouçam e eu gosto de o ouvir. Gosta de rezar o terço. Não fuma, como dizia o anúncio.

96 anos. Ele costumava dizer: "Se chegar aos 70, faço uma festa!". E o mesmo valia para os 80 e depois para os 90. Sempre achou que morreria cedo. Bem feito. Ninguém o mandava achar fosse o que fosse a esse respeito. E nunca fez festa nenhuma. Nem é preciso. Basta que ele lá esteja. Que me agarre os braços para ver se estou gordo ou magro. Que fique feliz por achar que eu saio a ele nos pulsos magros. Que se vá rindo. E queixando da mínima beliscadura à sua saúde invejável. E que vá largando pérolas como "Duas mulheres juntas como é que gozam?... Aquilo de bater prato com prato não deve dar grande resultado..."


SÓ ESTOU À ESPERA DA VAGA DE FUNDO!



Sim. Eu compreendo a angústia nos rostos dos milhares de portuguesas e portugueses que comigo se cruzam na rua e me imploram: "Senhor Vareta! Pela sua saúdinha, candidate-se a Presidente! Os outros candidatos a candidatos só querem é rock!" Eu compreendo. Sim.

Será do elevadíssimo padrão moral que tem pautado o meu comportamento nestes quase 28 anos de vida? Será da mescla única de qualidades humanas e profissionais que me caracteriza? Será esta aliança ímpar entre beleza física e profundidade intelectual? Será da minha modéstia? Não o sei. Sinto, isso sim, que estou habilitado a responder aos anseios de uma larguíssima franja do eleitorado português que pretende ver como Chefe de Estado uma figura insígne, com uma reputação sem mácula, com um temperamento político equilibrado e, claro, com uma vareta que reforce o orgulho pátrio na singularidade do macho lusitano.

É assim natural que a populaça ígnara olhe à sua volta e se questione: "Quem, Senhor meu Deus, quem poderá tutelar os nossos destinos enquanto Estado-Nação?" (por populaça ígnara deve entender-se o conjunto de cidadãos votantes que não reside em Tomar nem na freguesia da Ajuda, pois esses já de há muito conhecem a resposta). Face ao panorama semi-árido da política portuguesa nestes tempos de encruzilhada, acho que é o meu dever enquanto cidadão responsável e modestamente consciente das qualidades que me fazem pairar por sobre as massas ululantes e iletradas, acho que é meu dever, repito, prestar-me ao sacrifício e avançar para Belém - no fundo, basta-me descer a Calçada da Ajuda...

As minhas intenções não são vãs. Reparem: ao contrário de 85% dos taxistas, eu não venho dizer: "Eu só queria era mandar nisto tudo durante 15 dias! 15 dias chegavam! Isto dava cá uma volta!..." NÃO. Eu quero "orientar" isto tudo durante 10-anos-10. O meu médico de família poderá facilmente garantir que tenho para tal as condições de saúde necessárias. Serei, se o eleitorado irracional e animalesco se deixar por uma vez iluminar, um garante de estabilidade, um Presidente um pouco à imagem da Vodafone: durante dez anos, onde quer que você esteja eu vou estar lá. E digo dez anos porque não duvido da reeleição. Nem poderia duvidar. Isso seria um pensamento ímpio e pecaminoso. Era o que mais faltava!! Havia de foder os cornos a cada um dos eleitores que me roubasse o sonho de estar reformado antes dos 40!!

Bom... Quer isto dizer que eu estou pronto para vos servir à frente do mais alto cargo da Nação. Conheço a máquina do Estado. Sou um bom filho. Nunca tive filiação partidária. Sei dizer uma ou outra palavra em estrangeiro. Fui delegado de turma uma vez no Secundário. Mastigo de boca fechada. Não tenho o Padre Melícias por confessor. Não existem dúvidas quanto ao meu estado civil. Não me chamo Valéria Vanini. Por tudo isto - que não é nada pouco, convenhamos - percebo que muitos olhem para mim como o melhor candidato a candidato. Eu também sinto o mesmo quando me vejo ao espelho.

Este é o meu primeiro passo. Se outros se seguirão ou não depende em exclusivo de vocês, cidadãos comuns, corja de chupistas. Se quereis um Presidente que vos respeite, suas alimárias, que vos encha de orgulho e de certeza no porvir, então deixai-me sabê-lo! Manifestem-se! Organizem jantares! Convidem-me para lançar a minha autobiografia política! Arranjem-me uma entrevista no Herman SIC! Comecem desde já a porfiar para que a Lei seja alterada e permita a candidatura de pessoas com menos de 35 anos! Não quero cair no maniqueísmo, mas se não o fizerem, em última instância perdem muito mais do que eu. Bem feito! Mariquinhas!

terça-feira, fevereiro 17, 2004

Diálogos de Amizade, 8

- Já soubeste do Nélson?
- Sim. Já estava à espera.
- Eu bem o avisei. Largar o banco por aquela coisa da consultadoria externa, estava-se mesmo a ver.
- Essas coisas só dão quando um gajo tem muitos padrinhos. O gajo, convencido que era bom, vai de peito aberto e lixa-se, claro.
- Eu dei-lhe todo o apoio! Quando o gajo me falou nisso, eu disse: “Grande ideia, Nélson. Vai em frente, tu és capaz!”. O tipo estava com aquelas dúvidas da treta, de não ser capaz de se lançar sozinho, de ser um passo maior que a perna...
- Eu falei-lhe da carteira de clientes. O gajo estava receoso que não chegassem, que ainda era cedo e o caralho, mas eu disse-lhe que não fosse cobarde e se atirasse. Se não fosse agora, que é novo, ia ser quando? Com 50 anos?
- Bem, a verdade é que eu nunca lhe reconheci uma capacidade por aí além, mas sabes como é...
- Claro, pá. Eu também vi logo que o gajo se ia lixar se não tivesse clientes, mas nós somos amigos dele, temos que lhe dar força.
- Encontrei o pai dele ontem. Diz que o gajo está na merda, teve que vender a casa.
- Já soube. Telefonaste-lhe?
- Eu, não, e tu?
- Também não, mas o gajo sabe os nossos números.
- É... ele sabe que somos amigos e estamos aqui para o que for preciso.

sexta-feira, fevereiro 13, 2004

SEXTA-FEIRA, 13, VÉSPERA DE SÁBADO, 14 - E TUDO ISTO SE PASSA EM FEVEREIRO...

Quem foi São Valentim? Não sei. Nem tão pouco me interessa. Ao que parece o dia 14 de Fevereiro é-lhe votado e é suposto os namorados namorarem e gastarem dinheiro. O português, amigo do folguedo, depressa agarrou com as duas mãos mais uma festa propícia ao convívio íntimo. E lá estão as lojas cheias de ursinhos, flores, postais e caixas de chocolates - e não são só as lojas que ficam perto dos hospitais. Tanto melhor. É preciso é que o dinheiro circule.

Em que pérola da lírica pop contemporânea poderia eu, então, pegar na véspera de tão peculiar festividade? Pensei, por estranho que pareça, pensei bastante e lá encontrei a resposta num dos melhores álbuns da safra de 1981: The Lexicon of Love, dos ABC. Foi nesse conjunto de cantigas que o platinado Martin Fry se deu ao trabalho de escrever uma "coisa" chamada Valentine's Day, passando-me inconscientemente a responsabilidade de a traduzir, tornando-a clara e perceptível aos olhos dos milhões de cidadãos lusófonos que nos visitam.

Aqui fica, assim, a sugestão de fim-de-semana: cuidado com a sexta-feira 13, não vos vá acontecer ficar com o mesmo ar caramelizado destes pombinhos.



VALENTINE'S DAY

When the postman don't call on Valentine's day
Amanhã é Sábado e não há distribuição de correio
And Santa Claus don't come on a Christmas Day
E o Natal também calha ao Sábado, este ano
That umbrella won't work on a rainy day
O mês de Fevereiro vai seco... vamos ter água no Verão
Don't ask me, I already know
E os "americanos" dizem que Setembro vai ser muito quente

When they find you beached on the barrier reef
A barreira de coral é um ecossistema muito frágil
And the only pleasure treasured is in map relief
Os novos SIG's - Sistemas de informação Geográfica - são muito úteis para as revisões dos Planos Directores Municipais
The choice is yours, sure, saint or thief
A RTP vai estrear um concurso novo chamado "Um Contra Todos"
Don't ask me I already know
O Prof. Marcelo não gosta que lhe perguntem se vai ser cabeça de lista às Europeias ou Comissário

When they baked your cake in little slices
O meu fogão tem o forno avariado
Kept your eyes on rising prices
E até estou a tremer só de pensar no próximo aumento da bandeirada nos táxis
Wound up winning booby prizes
Será que a Cinha Jardim também fez plástica ao seios?
I'm sure you'd like to think you know what life is
A minha avózinha que Deus tem até se havia de benzer se visse como isto anda...

Find destiny through magazines
Foi uma pena acabarem com a Ana + Atrevida
Liplicking, unzipping Harpers and Queens
Não gosto dos bares das Docas - muito menos do Queens
From here to eternity Without in-betweens
Quem cantava o "From here to eternity" era o Engelbert Humperdinck
Don't ask me, I already know
Eu sei porque eu tenho o disco

With your heart on parade and your heart on parole
Esta coisa das pulseiras electrónicas de vigilância anda muito popular
I hope you find a sucker to buy that mink stole
A Sofia Aparício faz campanhas contra o uso de peles verdadeiras no vestuário
School for scandal
Os resultados das provas de aferição foram um escândalo
Guess who's enrolled?
E lá vai o Prof. Sousa Franco para Deputado Europeu, hein?
So ask me, I already know
Já há muito tempo que não aparece na televisão o astrólogo Paulo Cardoso... esse é que sabia tudo

When they find you beached on the barrier reef
Mas agora pondo de lado a conversa de merda
When the postman don't call on Valentine's Day
Tu até és gira, pá, podíamos ir sair
When the only pleasure treasured is in map relief
Eu até comprei o Guia do Lazer, do Público
When you don't tell the truth, that's the price you pay
Íamos jantar assim a um sítio porreiro sem ser muito caro
When I'm shaking a hand, I'm clenching a fist
Depois dávamos as mãos e passeávamos um bocadinho
If you gave me a pound for the moments I missed
Se eu te parecer ausente é dos comprimidos que ando a tomar
And I got dancing lessons for all the lips I shoulda kissed
Só não me arrastas é para o Salsa Latina ou para os Alunos d'Apolo
I'd be a millionaire
Se eu fosse mais rico alugávamos uma suite no Carlton
I'd be a Fred Astaire
Mas qualquer cama serve para eu dançar em cima de ti como o Fred Astaire

ABC, The Lexicon of Love


quinta-feira, fevereiro 12, 2004

RAZÃO TINHA O GENET PARA DESCONFIAR DOS EMBARCADIÇOS...



Catano! O gajo é um animal de hábitos, certo? O gajo, como qualquer mamífero do sexo masculino, marca o seu território de uma forma ou de outra, verdade? O gajo que é gajo é fiel nos seus padrões de consumo e em tudo aquilo em que a líbido não interfira, correcto? Assim sendo, só me resta expelir um sonoro "Ora foda-se!" e explicar porquê.

Cheguei do almoço, tranquilo, cheio de sangue no estômago e com uma medida correcta de flatulência. Sentei-me pesadamente em frente ao computador e pensei, de mim para comigo já que mais ninguém aqui estava: "Ó Vareta, 'bora lá espreitar a Tasca da Cultura a ver o que aquele velho safardana d'O Bom Selvagem nos arranjou para hoje". Se bem pensei, melhor o fiz. Esperei, pacientemente, que a página se vestisse e apanho com esta mensagem nas ventas: "O Bom Selvagem vai embarcar numa aventura. Voltará em breve. Melhor do que nunca."

Cheirou-me a esturro. Pior ainda quando vi que o primeiro post de hoje naquela baiuca se chamava "Fim do Primeiro Acto". E o "Ora foda-se!" formou-se-me no espírito quando li:

"A Tasca encerra as suas portas por um tempo mas volta.
Vou aparecendo de forma intermitente mas apenas para vos garantir que estou ainda estou alive and kicking, e responderei às cartas como de costume.
É que estou velhote e não me resta muito tempo, é normal, a vida é mesmo assim.
Há uma coisa que preciso de fazer antes de esticar o pernil e por acaso vou trabalhar para vocês todos, mas em reclusão e isolamento."

Catano! E agora?! Toma-se uma decisão destas sem pensar nos efeitos colaterais que ela provoca na rotina diária de milhões de portugueses?! Condena-se assim à participação no "Olá Portugal!" uma franja considerável da população nacional com mais de 65 anos?! Somos forçados a trocar O Bom Selvagem pelo Carlos Ribeiro?!

A Tasca da Cultura é, salvo melhor opinião, um dos 4 ou 5 melhores blogs nacionais - sim, que só a modéstia me impede de escrever que é, ao lado deste Porquinho, o melhor blog nacional. Lê-lo é, para mim, um hábito diário, uma coisa tão enraízada como trocar de roupa interior. É subsersivo. É corrosivo. É um antibiótico de largo espectro. É tresloucado. É genial. Numa palavra: é um clássico! E a mim, quem me tira os clássicos...

E pumba! Catano! Agora ameaçam tirar-me mesmo um clássico, durante uns tempos! O apelo da maresia ou o onírico canto de alguma sereia melíflua levam a que O Bom Selvagem embarque... Humpf! Eu até podia, se quisesse, até podia encher páginas e páginas de piadas chocarreiras sobre marinheiros e os seus peculiares hábitos sexuais. Eu até podia lembrar que a doidivanas da Tonicha cantava uma cantiga sobre marinheiros. Eu até podia apresentar estatísticas sobre naufrágios. Mas não me apetece.

Apenas fico à espera que as portas da Tasca reabram em breve, alimentado por duas certezas: a de que a espera será compensadora e a de que a blogoesfera não se pode dar ao luxo de passar muito tempo sem um autor do calibre d'O Bom Selvagem.

Ora foda-se!


Alambridatia, 7

- Desculpe...
- Sim?
- Não me contive, e tive que vir falar-lhe.
Ela sorriu um sorriso levemente amargo e cansado.
- Vê? É esse mistério. Esse sorriso delicioso e radiante, essa indefinível sombra que lhe vela o rosto...
- Não há nada a esconder, garanto-lhe.
- Mas claro que há! É todo o mistério da condição feminina que eu vejo nesse sorriso, nesse porte orgulhoso e impecavelmente devastador de mulher que sabe a impressão que causa, na volúpia ousadamente sugerida pela sua roupa.
- Tu és um galanteador...
- Por favor, não reduzas a importância que tens. Quero conhecer o que te tolhe a fruição de toda essa generosidade física. Quero perceber porque não reinas tu sobre todo o espaço que iluminas.
- E então, que sugeres?
- Deixa-me estar aqui contigo. Vamos falar um dia inteiro, vamos deixar escapar sinais da nossa humanidade, vamos tocar nas nossas almas.
- Um dia inteiro? Tás louco? Meia horita e já gozas. 150 Euros, mais o quarto e só com preservativo. E nem penses em vir pra cá com porcarias.

terça-feira, fevereiro 10, 2004

MAIS CEDO



Hoje cheguei mais cedo do que esperava. Quero dizer: ontem fui a um sítio do qual só devia voltar amanhã mas vai-se a ver e voltei hoje. Mais cedo, portanto, do que esperava. O que de certa forma me espanta é que não sei o que hei-de fazer a este carácter inesperado do meu regresso porque ninguém me esperava.

Quero dizer: ninguém me esperava, salvo seja. Dois dias ou três não eram motivo para qualquer Penélope se pôr a tecer mantas para o seu Ulisses. As pessoas contavam com o meu regresso amanhã e planificaram as suas vidas como se eu não existisse neste intermezzo. E quem sou eu para lhes levar a mal tal atitude? Já antes de mim Garrett o escreveu: "Ninguém!". Pois é. Mas mesmo assim não sei o que fazer com este regresso inesperado.

Quero dizer: "não sei o que fazer" é uma expressão exagerada. Não sei como o partilhar sem forçar este incidente temporal aos planos alheios, isso sim. Isso é bem dito. Bem dito, salvo seja: a minha modéstia impede-me de tecer considerações de valor sobre o que digo ou escrevo ou faço. Só que tenho um regresso inesperado nas mãos e sinto-o condenado a ser apreciado apenas a posteriori. Se telefonar a alguns amigos e disser que já estou "cá", o que quer que "cá" seja, o mais provável é que achem inesperado o facto de não ter estado, o que equivaleria a tomar um antibiótico com meia garrafa de gin. Se telefonar a alguém de família, ficarão tranquilos por me saber "cá" mas "cá" é onde eles não estão e teríamos um regresso inesperado desperdiçado em rede de satélite e anulado pela frase "tanto melhor". Se aproveitar para sair com quem não sabia que eu tinha partido antes deste regresso, será um exercício de onanismo mental porque não poderei partilhar o adjectivo que me martela a moleirinha: inesperado.

Quero dizer: hoje voltei mais cedo, o que - tudo leva a crer - só para mim constitui, de momento, algo de inesperado. Seria preciso que outros acasos se somassem ao acaso do meu regresso antecipado para que este se tornasse inesperado para outros. Como eu não sou o Paul Auster, tenho as minhas dúvidas que tal venha a suceder. Dúvidas, salvo seja, que duvidar do acaso não me parece avisado. Resigno-me e conformo-me, como qualquer fadista de Alfama, perante as probabilidades mais cinzentas e bisonhas.

Quero dizer: ante a falta de vontade de voltar a partir para chegar um pouco mais tarde se bem que mais cedo do que o previsto, repetindo o inesperado, deixo aqui lavrado em acto público que voltei hoje quando só me esperavam amanhã. Assim, quando quem me esperava ler isto poderá pensar coisas como "Ai o cabrão já cá estava e não disse nada!" à sua inteira vontade que me sentirei perfeitamente escudado.

P.S. - Nunca estive em Oklahoma, mas como voltei pela auto-estrada...

segunda-feira, fevereiro 09, 2004

Reflexões de fim-de-semana, ou de como a incriatividade pode ganhar forma escrita

Do paradoxo da justiça:

Porque é que tantas coisas certas acabam por dar errado?

Dos atrasos na gestão do Porco:

Ultimamente tenho assistido a um proliferar de belogues que, simpatica e algo despropositadamente, nos lincam. Longe de estar(mos) a ser snobs, estamos demasiado ocupados com coisas vãs (trabalho, família, etc.) para Vos acrescentar à coluna do lado, onde vocês merecem. Não temam, que o Vosso dia chegará.

Das razões escondidas deste poste:

...a menos má será acabar com este despautério de comentários acumulados. Isto não é o Pipi para ter centos de disparates apensos às pérolas de intelectualidade que nós oferecemos. Como se pode ver, não enfermo da modéstia terminal que apoquenta o Vareta lui même.

sexta-feira, fevereiro 06, 2004

E VAI-SE A VER E É SEXTA-FEIRA OUTRA VEZ...

E ontem foi quinta. E eu fui ver os Mogwai, ali à Garagem do Paraíso. Belo concerto, em verdade vos digo. Grande exercício o de domar a electricidade mais pura de acordo com padrões de beleza inquestionáveis. Gostei tanto ou tão pouco que hoje, na já costumeira tradução, NÃO os vou homenagear. Pelo contrário. Os homenageados, quando comparados com os escoceses Mogwai, encarnam o espírito "and now for something completely different" - que é como quem diz, em estrangeiro, que não se deve confundir o olho do cu com a Feira de Beja.

Hoje a escolha recai nuns suecos. Serão os ABBA? Não. Os Cardigans? Também não. Os Whale? Os Wannadies? Os Kent? Não, não e não. Quem são então?, perguntam vocês, meio desconfiados. E eu, benemérito, respondo: são os EGGSTONE. Parece-me que ouço algumas vozes descrentes: "Os quem?!", "Egg-quê?!" ou mesmo "Lá vem ele outra vez armado ao pingarelho falar de coisas que pouca gente conhece só para passar por intelectual de meia-cultura... Mete mas é o ovo no cu!". Sim, ouço essas vozes e apiedo-me delas. E relembro as Escrituras: "Bem aventurados são os pobres de espírito..."

Per Sunding, Patrik Bartosch e Maurits Carlsson juntaram-se em 1986 para formar os Eggstone e desde esse ano têm feito algumas das melhores canções pop não só da invernia nórdica mas de todo o continente europeu. A escolha de hoje é uma canção de amor esquizóide e bizarra, um poema que parece uma composição de escola primária até que o último verso do refrão a transforma na mais bela história sobre gajas e elementos. E é com esta sugestão - a de que vos laveis - que vos ofereço em português de Portugal mais um pérola da lírica pop contemporânea.

WATER



water is good for your health
A tarifa da EPAL até é baixinha - faz parte do índice de preços que determina a inflacção...
water is good for your body
Mas, por mais que tome banho em casa, sinto-me melhor no Vimeiro.
and you can drink it with lime and with lemon
Aquelas "águas santas" têm um gosto esquisito...
or drink it pure
O que vale mesmo a pena são os banhos de agulheta.


water can turn into snow
Durante anos bebi água da Fonte da Asseiceira.
water can turn into icecubes
Mesmo sabendo que funcionavam dois aviários ali bem perto.
and in the air that you breath there is water
Cheirava mal quando eles queimavam as carcaças das galinhas doentes.
that might turn into fog
Mas a água era boa... era mesmo! Garanto-vos!

water can be found in waterfalls
Nunca visitei nenhuma cascata,
water can be found in tennisballs
Mas já apanhei com uma bola de ténis nas fuças.
water can be found in orchids
Não tenho plantas em casa,
water can be found in you
Mas antes de fazerem obras no telhado entrava um fiozinho de água pela parede do quarto.
in your lips
Felizmente não te importavas com a humidade.

water contains lots of salt
Das Salinas de Rio Maior extrai-se sal-gema.
water contains lots of minerals
Nas Minas da Panasqueira suspenderam a extracção de minério...
and it can be boiling or freezing or sparkling
Não percebo o gozo da água Frize: ou se bebe 7Up ou Água das Pedras!
or just be floating around
E depois aquela merda dá-me gases...

with water you can make tea
O chá de coca é outra fraude - aquilo não dá moca nenhuma!
and with water you can make coffee
Mas admito que bebo café em excesso - isso fará de mim um drogado?
and if you're drinking a bottle of red wine
Se ao menos pudesse beber um copinho no local de trabalho...
it's mostly water
Mas só me dão café... e águinha da torneira.

water takes you around the world
De todos os sítios do mundo, a água da torneira em Lisboa logo havia de vir do Castelo de Bode, bem pertinho de Tomar...
water even can be heard
É como se ouvisse a voz do sangue a chamar por mim...
water is in every word
"Vareta", diz a voz, "filho, já começaram a construir o novo Pavilhão Gimnodesportivo!"
water is in lemon curd
Depois fervo a água com uma casquinha de limão
and in every bird
E a "voz do sangue" aclareia a minha voz de rouxinol...

water can be found in waterfalls
Sim, sou um pacóvio que nunca foi a uma cascata
water can be found in tennisballs
Sim, roubava bolas de ténis que se perdiam junto ao Rio Nabão
water can be found in orchids
Mas nunca roubei orquídeas!
water can be found in you
As que te ofereci paguei-as do meu bolso... e bem me custou! Fazes ideia do preço a que estão as orquídeas?!
in your lips
Vê lá se ao menos as pões em água...

Eggstone, The Spanish Slalom

E é isto. Bom fim-de-semana.


quinta-feira, fevereiro 05, 2004

Diálogos de amizade, 7

- Não sei que hei-de fazer, pá.
- Realmente, é muito chato...
- É o colégio dos putos, é o piano da Sofia, é o karaté do Afonso... não dá pra tudo. Vou ter que os tirar.
- Tu não faças isso!
- Que é que tu queres? Já se sabe como é, ao fim do terceiro contrato puseram a Joana na rua. E agora, arranjar emprego é impossível. Sobretudo para uma mulher da idade dela, com filhos.
- Está bem, mas não podes hipotecar o futuro dos miúdos. A escola oficial, além de ser um perigo, está cheia de professores armados em funcionários públicos, que só querem receber o deles no fim do mês. Os bons professores estão na privada.
- Não será bem assim...
- Claro que é! Tu ouves queixas em relação às privadas?
- Não, mas isso não quer dizer que as públicas sejam todas más.
- Claro que são, pá! Tudo do pior. E também não podes deixar para trás a componente extra-curricular da formação deles. É importantíssimo que os mantenhas nessas merdas da música e do karaté.
- E o dinheiro, vou buscá-lo onde? Sou só eu a ganhar, pá...
- Eh, pá, isso já não sei... não tens nada que possas vender?
- Só se fosse o carro. Podia comprar um utilitário em 2ª mão. Mas até para vender carros está difícil...
- Eu ajudo-te, pá. Fico-te com o carro.
- A sério?
- Sério. Dou-te 15.000 Euros por ele.
- 15.000??? Mas tu estás doido? O carro está praticamente novo, tem 6 meses! Vale, pelo menos, 20.000 Euros! Isso é proposta que se faça a um amigo?
- Pá... tu é que disseste que está difícil vender... e os amigos são para as ocasiões.

terça-feira, fevereiro 03, 2004

CONTAGEM DECRESCENTE



A verdade é esta: gosto dos Festivais Eurovisão da Canção. Mais do que gostar, vibro intensamente com cada edição. A 15 de Maio, lá teremos uma serigaita qualquer na Turquia a reconhecer que realmente Foi (por pura) Magia que ganhou o direito ao título de Embaixadora da Canção Portuguesa 2004. Como é dois dias depois do 13 de Maio, pode ser que uns ventos miraculosos da Cova da Iria a ajudem a conseguir um bom resultado. Mas isso não interessa, por agora.

O que quero partilhar com vocês é um sonho que acalento desde criança: representar Portugal na Eurovisão. Já pensei em tudo! Iria concorrer sob o nome Senhor Funda e as Varettes. A música é uma questão de somenos importância... Assim como assim, nunca ganhamos. A certeza é que a minha interpretação seria inesquecível, quer se tratasse de uma balada de fazer chorar as pedras da calçada ou de qualquer musiquita upbeat que lançasse as Varettes em loucas e acintosas coreografias.

Imagino-me nos bastidores, durante os ensaios, a tentar convencer a representante da Polónia - costumam ser bem giras, quando são gajas - de que uma ida ao meu quarto de hotel a faria alcançar um dó de peito mais possante e luminoso. Imagino-me a conseguir finalmente a cisão no bloco nórdico, fazendo com que a sueca, tomada pelo ciúme, ameaçasse de morte a finlandesa depois de a apanhar na minha cama, ao lado da croata e da macedónia... Imagino-me a ter que pagar em géneros às Varettes pela sua preciosa colaboração. Imagino-me a regressar a Portugal sem qualquer ponto mas com muitos números de telefone e muitas casas à disposição por essa Europa fora.

Não sei porque é que este belíssimo certame foi caindo no desamor de boa parte do público. Quer dizer, até sei. Vocês agora querem é rock... depois dá nisto. Mas todos os anos há, pelo menos, uma mão cheia de canções que valem a pena. Há, pelo menos, 10 ou 15 pares de pernas que valem a pena. E há, pelo menos, 6 ou 7 decotes que valem a pena. É claro que hoje o Festival já não é a rampa de lançamento de grandes nomes para a ribalta internacional que foi noutros tempos - e não deixa de ser triste se pensarmos que o último desses casos foi a Céline Dion...foda-se! Mas é uma instituição como poucas, que diabo!

O ano a que a fotografia acima aposta se reporta, por exemplo. 1963. Venceu a Dinamarca com o belíssimo "Dansevise" (Portugal só iniciaria a participação no ano seguinte). É uma canção ainda hoje revisitável: tem uma aura de "James Bond" e uma guitarra que me faz sempre lembrar os The Monochrome Set. E tantos outros anos... A Sandie Shaw descalça. A France Gall ninfeta e tão gira, a cantar Gainsbourg. A irlandesa Dana e o seu tom pastoral. A Isabelle Aubret. A Maciel com o seu "La la la la" e aquele ar de espanhola poderosa, tipo "Anda cá, anda, que eu desfaço-te em três tempos". Os Abba. Os Bucks Fizz. As holandesas do meu coração, as Frizzle Sizzle. A Amina. A cipriota Evridiki. O palhação do Johnny Logan. Os belgas Telex, a revolucionar o sistema com os seus sintetizadores analógicos. E as Tatu, no ano passado, a revolucionar o sistema com as suas... os seus... as delas... as... pronto.

O futuro da música pode não passar por ali. Mas também pode passar. Se ao menos a RTP apostasse no Senhor Funda e as Varettes... Para mostrar como são sérias as minhas intenções, deixo já uma sugestão para a letra da canção a interpretar: uma canção ganhadora, com um toque futurista mas dentro dos cânones clássicos da Eurovisão. Sim, que a mim, quem me tira os clássicos... Seria assim:

Sobe balão sobe, como um conquistador, que lá em cima há um grande grande amor e é bem bom e nem te dás conta quando cai a noite na cidade e até parece que foi magia (um título grande e expressivo é sempre bom)

Lembras-te de mim?
Como eu me lembro de ti...
Mãos macias de pudim
Cara de abacaxi (homenagem implícita a Rosa Lobato de Faria)

Lábios doces de cereja
Voz de amor a refulgir
As outras têm inveja
De tu me fazeres sorrir (homenagem a quem quer que fosse que escrevia as letras das Doce)

Segues os passos de um povo
Na manhã de cravo em flor
Vem fazer um mundo novo
Com paz, pão e muito amor (ah grande Ary!)

(e o refrão, este pedaço de sumo doce e espesso...)
La la la la la laaaa la la
É tão bom estar contigo assim
La la la la la laaaa la la
Eu ao pé de ti e tu ao pé de mim
La la la la la laaaa la la
Sabes a mel e a amendoim
La la la la la laaaa la la
És o meu refrão de uma canção sem fim uh-oh uh-oh

(violinos em Si, pizzicato: plinc plinc plinc plinc plinc)

Lembras-te de mim?
Como eu me lembro de ti...
Concertina e bandolim
Cucuru cucurrupi (mãe África...)

Amanhã é outro dia
Outra noite p'ra cantar
A ouvir telefonia
O Sala e o Despertar

Nosso amor é uma lenda
Qual Armando e Valentina
Tu fazes naperons de renda
Eu componho a sonatina

La la la la la laaaa la la
É tão bom estar contigo assim
La la la la la laaaa la la
Eu ao pé de ti e tu ao pé de mim
La la la la la laaaa la la
Sabes a mel e a amendoim
La la la la la laaaa la la
És o meu refrão de uma canção sem fim
La la la la la laaaa la la
É tão bom é tão bom para mim
La la la la la laaaa la la
Entrar em ti como um berbequim
La la la la la laaaa la la
Enquanto tu gemes eu já me vim
La la la la la laaaa la la
E se queres que te diga, és assim-assim uh-oh uh-oh

E pronto. Não me digam que não ganhávamos...

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