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Vareta Funda

O blog dos orizicultores do Concelho de Manteigas


quarta-feira, junho 29, 2005

A Carroça Filosofal

Isto é um relato tão fiel quanto possível de mais uma experiência nos limites do extra-sensorial passada a bordo de um táxi.

Praça de táxis da Boa Hora, por volta das 21h20. Entro no táxi, um Nissan meio podre, e informo o motorista: “Era para a Avenida Duque d’Ávila, fáchavor”. O motorista responde: “Era? Mas já não é ou ainda é? Eh eh eh eh…”. É o tipo de piada que me deixa com a frase “É mas é o caralho!” prontinha a disparar mas lá me contive. Agarrei-me ao telemóvel, pondo em dia algumas trocas de sms, e lá fomos seguindo. Até chegarmos à Avenida de Ceuta pouco mais ouvi do que umas interferências: “…francamente… este filhadaputa… estou farto disto… ‘tá bem, ‘tá bem… os portugueses quando tiram a carta pensam que compram a prioridade… era tirar a carta a 30% dos portugueses…”. Quando nos acercávamos da Praça de Espanha já eu arrecadara o telemóvel e estava disposto a fazer o resto da viagem em silêncio – eu estava disposto, o motorista nem por isso…
- Sabe… eu já estou farto deste planeta. Tenho que ver se conheço algum americano ou russo que me mande para outro planeta lá naquelas “sky-labs” – sabe, aquelas cápsulas… – que eles mandam lá para cima.
- Sempre deve ser mais calmo. – disse eu, esperando que ele captasse o subliminar apelo à calma. Quem me manda a mim ser subliminar…
- Ora aí está! Aquilo é só rochas e penedos e fragas e escarpas… E um gajo a comer daquelas ervinhas que por lá há ainda ficava melhor do que aqui. Habituávamos-se àquilo e já não queríamos outra coisa. Se eles se habituam, aqueles homenzinhos pequeninos que andam lá em Marte (ressalva: presumo que fosse Marte, já que o senhor dizia qualquer coisa parecida com Marda) …
- … - percebi depressa que esta era uma dissertação que não precisava de fermento.
- É que há um mistério que ainda ninguém conseguiu explicar, isto dos céus e dos astros… O céu, o céu… A gente sabe lá o que é que está lá em cima… Parece-nos azul… Nunca ouviu as meninas a dizer “ai quem me dera ter esta saia da cor do céu”? Mas nunca ninguém conseguiu explicar porque é que ele é azul. Céu, céu… Ó Céu! Céu é a minha vizinha, lá em Queluz! Ó Dona Céu! O meu amigo sabe que na ciência eles nunca usam a expressão céu? Pois não. O que eles dizem é que aquilo é uma abóbora (ressalva: pela minha saúde!, o senhor disse mesmo abóbora!) com um raio infinito e um fundo imaginário. Agora porque é que é azul… Se calhar é azul por causa do mar de Marte… se calhar eles têm lá um mar e como Marte fica por cima isto parece-nos azul…
- … - estive quase para perguntar por cima de quê ou de quem é que Marte ficava, mas achei melhor não.
- Qu’isso é das coisas que me faz confusão. Ora isto diz que são nove planetas fora os que ainda estão por descobrir. Se a Terra é o terceiro… E depois como a Terra é redonda ainda não consegui perceber se quando lançam os foguetões e as “sky-labs” – sabe, as cápsulas… – lá de Canaverêide (ressalva: foi mesmo assim, Canaverêide) ainda não sei se eles vão para cima ou se vão para baixo, ‘tá a ver? Portanto, eles saem para cima mas depois não sei se vão para cima ou para baixo… Era bom era ter umas asinhas… mas ainda devia ser preciso muito tempo para chegar lá acima, à esfera celeste… Uuuii… Bem podiam estar os padeiros cá em baixo a cozer pão para a gente durante dois anos…
- …
- É que o meu medo é que, como os nove planetas estão todos alinhados, já viu se eles começam a cair em cima de nós?! Ficamos aqui que nem podemos respirar!
- E pode parar aqui assim, na esquina com a 5 de Outubro…

Confesso que fiquei encantado com o registo poético de quem acredita morar num terceiro andar de círculos concêntricos que constituem o sistema solar – construção frágil de maus alicerces que a qualquer momento poderá desabar, ao que parece. E compreendo a angústia latente de quem não sabe se o terceiro andar é a contar de cima ou a contar de baixo…

terça-feira, junho 28, 2005

Microfábulas – XV

Havia, certa vez, uma adolescente que passeava as suas angústias e depressões pelo recreio da escola secundária onde procurava completar o 10º ano. “Lá vai a Morcegona!”, diriam uns; “Lá vai a Aida!”, diriam os mais educados. Mas, mais do que ir, Aida estava – estava quase sempre parada em contemplação ou assim nos seria sugerido pela placidez bovina com que parecia fitar o infinito. Às vezes parava de fitar o infinito (que, no caso concreto, correspondia ao muro mal rebocado da secundária construída à pressa nos finais dos anos 80) e garatujava qualquer coisa no seu inseparável caderno de capa preta. Era o seu confidente e era naquelas páginas que despejava, em rebuscada prosa poética, as frustrações acumuladas nos 16 anos de vida: “Eu sou um membro gangrenado. Eu sou a verruga na face perfeita. Eu sou o tique nervoso que nos obriga a olhar. Eu sou a marca da sarna na pelagem perfeita de um cão de raça. Eu sou a falha que tranquiliza os outros na sua superioridade. Está decidido: amanhã vou desfrisar o cabelo!”.

Para além de carregar um nome próprio que a tornava invariavelmente a primeira na chamada, Aida estava estigmatizada por um forte e crespo cabelo preto que usava muito comprido. A sua altura algo exagerada para a idade e a falta de quaisquer formas bem definidas no seu corpo faziam com que se salientasse de entre os colegas mas por razões inconvenientes para a psique de uma adolescente. Dos pais também não tinha grande apoio: a mãe era figurante do SIC 10 Horas e o pai era serralheiro, daqueles à antiga – sempre que falava com a Directora de Turma dizia-lhe “A senhora chegue-lhe, se for preciso! Eu levei muita lambada até à 4ª classe e só se perderam as que caíram no chão! Esta malta de agora tem muitas facilidades, é o que é! Sabe com que idade é que eu comecei a trabalhar?! (…) Sabe quantas vezes é que o meu pai chegava a casa entornado e me corria a mim e aos meus irmãos à cinturada? (…) Sabe o que é levar um pontapé no cu com umas botas cardadas? (…) E doutra vez estava eu e o comer à ceia só chegava para três… (…) Por isso já sabe: não se acanhe! Cá por mim pode arrear-lhe quando for preciso que a mim ensinaram-me cedo que, isto das letras, se não entra a bem pelos olhos adentro, entra a mal por onde as mãos puderem malhar!”. Tímida por natureza, Aida poucos ou nenhuns amigos fazia e só encontrava refúgio nos devaneios literários ingénuos a que se entregava com muita frequência.

Eu sou um corvo entre colibris. Eu sou o chanato raso entre saltos agulha. Eu sou o poste de basquetebol entre bailarinas. A puta da Lúcia mete-me nojo. O João Carlos é um estúpido e nunca olha para mim…”.

Pelo seu carácter fechado, Aida nunca ganhara muita destreza social nem tão pouco uma noção asseverada do que é ou não é próprio em cada ocasião. Daí que a turma estivesse numa expectativa mal contida quando a professora de português pediu a Aida que lesse em voz alta uma redacção sobre o tema “Eu…”. Levantando-se ao som de alguns gritinhos de “Mor-ce-go-na! Mor-ce-go-na!”, Aida encheu-se de brio e começou a ler:

Eu queria existir nos outros ou na ausência deles. Tudo menos ser eu ou este eu rodeado de outros eus padronizados que me devolvem as minhas diferenças ao ponto de sufocar e de sentir que estou a perder o pé num tsunami de características que o meu eu não possui. Eu sou mais acessória que os outros. Eu sou mais descartável porque não pertenço. Ninguém vê a minha dor e os meus passos são sempre só meus e ecoam num vazio tão cheio de vazio, num nada tão absoluto e negro como o meu cabelo que eu faço tenções de rapar quando for tirar sociologia para Lisboa. Eu sou um somatório de qualidades desnecessárias que resultam numa imagem de defeitos e assim ninguém vê que atrás do preto que transpareço há uma plêiade de cores vivas porque eu vivo e respiro mas respiro sozinha e choro sozinha as lágrimas que sorvo de volta e me sabem a sal e a muco. Eu sonho apenas nas asas das palavras que abortam de mim em torrentes volumosas e se espraiam em tinta como magma quente que me queima a carne dorida e a faz sarar até que um novo rasgão se abra pela indiferença dos outros e eu sofra de novo sem que ninguém algum dia pare para olhar para mim e pedir desculpa. É a mesma coisa em Educação Física, onde todos pensam que, por ser alta, não me magoo com os encontrões nos jogos de basquetebol mas magoo e sofro redobard… redrob… redobradamente com aquilo a que eu chamo as ofensas Twix que me fazem doer duas vezes, uma no corpo e outra no espírito. E os rapazes que me atiram as bolas com força dirigidas ao peito só porque os meus seios mal se notam e os que gozam com a minha falta de anca e as gajas que me chamam morcegona e os professores que me ignoram porque como me chamo Aida fico sempre na primeira carteira que é que fica mais perto da porta e tenho sempre que ser eu a abrir a porta às auxiliares quando elas vêm trazer o giz ou o livro de ponto e as pessoas que passam por mim na rua e reparam e pensam como deve ser triste ser-se tão saliente e desengraçada e o rapaz de quem eu gosto em segredo e que só tem olhos para uma bimba ordinária e mamalhuda a esses todos eu só digo que…”
Nisto, vzzzzzzzzzzzzzt!

Moral 1: as aulas continuam a ter lugar em períodos de 50 minutos e o toque de saída é religiosamente respeitado.

Moral 2: não há cu que aguente uma depressão adolescente.

segunda-feira, junho 27, 2005

Em mês de Santos Populares...
A devoção pelos santos é muito portuguesinha. Claro: não nos custa a aceitar que Deus há só um – que na verdade são três que formam um só, salvo o erro… – e que não lhe conheçamos o rosto senão como recompensa por uma vida justa e sofrida no Dia do Juízo Final, quando já não podemos comentar com ninguém qualquer coisa do género “Vai-se a ver e o gajo parece o baixista dos ZZ Top!!”. A Imaculada Concepção por obra e graça de uma pomba, a vida, a morte e a ressurreição de Cristo, a Santíssima Trindade e os restantes dogmas da Igreja não fazem espécie ao português. Agora, não nos podiam pedir para engolir isto tudo assim às secas, não! Para que um português se sentisse seguro com o catolicismo era necessária a figura do intermediário. E é aí que entram os santinhos.

O processo de canonização é, aos olhos lusitanos, um processo de desumanização, em que o/a eleito/a transcende a existência material e assoma à categoria de mito. Para nós, o que interessa não é o que o santo fez em vida nem a forma como foi martirizado; o que nos interessa é que ele já está “lá em cima” e pode servir de cunha para as nossas precisões.

Tal como o português segue mais depressa o alvitre do vizinho hipocondríaco que o do farmacêutico ou do médico, também se fia mais nos santos que em Deus Pai Todo Poderoso. É-nos intrínseco: é que os santos podem sempre dar um jeitinho enquanto que com Deus as coisas já piam mais fino, há uma espécie de livro do deve e do haver e nós nunca fomos de boas contas…

Acho fascinante aquela espécie de “tabela de emolumentos” para a graça que se pretende: nas pequenas aflições não vale a pena maçar as altas figuras da hierarquia celestial; se o caso já é mais sério vamos a Nossa Senhora de Fátima que “ao menos percebe o que nós dizemos e sempre é mais séria que a Nossa Senhora original, já que a nossa, ao menos, não consta que tivesse ficado prenhe de algum melro que estivesse na azinheira”; se o caso é de vida ou de morte, aí – e só aí – recorremos ao “Supremo Tribunal” ainda que privilegiando sempre a figura do Filho, que sempre andou cá em baixo e até devia ser um gajo compincha, capaz de fechar os olhos às nossas pequenas faltas.

E os padres? Bom, os padres são uma espécie de “porteiro da repartição”, o gajo que convém conhecer porque pode deixar cair uma palavrinha em nosso favor. Mas o santo, o santo é que é a figura chave: o artolas que conhece toda a gente e que resolve quase tudo, com a nítida vantagem de aceitar que lhe paguem o favor a pronto e de uma vez só, evitando assim que fiquemos na obrigação de lhe dar uma garrafa de uísque (e mai’la caixa de Ferrero Rocher para a patroa…) todos os Natais.

Por isso, celebrar os Santos Populares é uma expressão de patriotismo; de um patriotismo esclarecido e convicto das nossas prevaricações colectivas e dessa certeza de que, mais do que os grandes feitos, o que une verdadeiramente um povo é a consciência dos defeitos que partilha.


ILHA

Uma ilha têm um cone vulcânico espantoso, que se ergue do mar 2.351 metros e bem acima das nuvens. Visto ao longe, o vulcão é uma massa ciclópica cinzenta que assenta numa base de floresta e pastagens verdes. As povoações, pequenas, parecem minúsculas e desgarradas. Mais perto, há vinhas dispostas em cubículos circunscritos por grossas paredes de lava a perder de vista sobre o Canal. Mesmo em frente, há dois rochedos, um vertical e outro dito “deitado”. Mesmo assim, depois de duas horas e meia de avião sobre o oceano, aquela ilha não deixa de parecer pequena e perdida no oceano. As pessoas lá chamam-se picarotos e gostam de música. Muitos deles tocam-na e estudam-na profusamente. Talvez vivam da pesca, de serviços ou mais provavelmente do leite e das pastagens. Diante do coreto bem arranjado as pessoas mais idosas arrumam-se calmamente em cadeiras de praia, à espera de música. Placidamente. Vai tocar uma das dezanove sociedades filarmónicas que existem na ilha. Só naquela pequena vila, há duas. A banda, bem vestida e digna começa a tocar. É uma peça complicada. Nada daquelas fanfarras dissonantes de bêbados. A certa altura tocaram um dos andamentos da Sinfonieta de Shostakovitch. Estava pasmado, ainda agarrado ao meu pão com chouriço, que comprei assim que saí do barco que cruzara o Canal. (Sim, o tal do mau tempo…). Pensava que manias colectivas poderiam er vingado numa terra assim, para além da atávica tendência para o alcoolismo, do futebol e outras, a que nos habituamos . Mas não - A Música!...

Noutras ilhas próximas são as touradas à corda, que ganham foros obssessivos ou então já vícios suburbanos. Ali, os miúdos acampam, vindos de outras partes ou ilhas. Aliás, é um hábito vulgar naquelas partes entre os jovens. Que me importa que houvesse um único sítio com computadores onde pude descarregar as minhas fotos digitais?
Espantados estavam também dois ingleses, que deviam ser metade dos turistas estrangeiros na ilha e que tinha encontrado de tarde, a meio da subida do vulcão – “hey botanists!” – disseram de longe. Acenei-lhes. O sorriso franco dele acho que também tinha que ver com o contentamento e emoção de estar naquele sítio a ouvir a música da Sociedade Filarmónica da Madalena do Pico. “Um gajo aqui, pode perder-se, drogar-se, olhar para o mar, emigrar ou então estudar e tocar música e ser uma pessoa pela positiva”. – foi o meu pensamento fútil.

Mais tarde, ao entrar adentro do que resta da floresta arcaica da ilha, no Pico do Caveiro, rocei árvores anãs, fetos antigos, lianas e nevoeiro. Aqui, há coisas que já perdemos.



Foto da Tampa - Madalena do Pico, Julho de 2004

quinta-feira, junho 23, 2005

Girafas em Chamas



Salvador Dali era um grande maluco. Mas um maluco que sabia desenhar. A sua imaginação delirante arrebatou a Espanha e o Mundo em geral. Quando ele morreu, confesso que não fazia ideia de quem era. Sei que houve uma extensa fila para as despedidas, do género da do Papa João Paulo II.

Lembro-me da reportagem. Havia uma senhora com os seus sessenta anos, que tinha levado o neto, com cinco ou seis anos, para que este pudesse um dia mais tarde dizer que tinha visto o Dali em pessoa. Ou em cadáver, esse invólucro da alma. Sim, porque uma coisa é ver o cadáver do Dali, com os seus bigodinhos pontiagudos espetados para cima - cheios de graxa ou lá o que era - e outra coisa teria sido conhecer o génio daquele corpo traduzido em fala, expressões, opiniões e actuações.

Com o tempo, acabei por me cruzar com a obra de Dali e soube um pouco da sua vida. Tal como o facto de ele ter roubado a outro surrealista - julgo que era Paul Élouard - a mulher que o acompanhou em vida.

Gala, de seu nome, não lhe foi sempre fiel. Dali até lhe comprou uma casa só para ela e para que esta recebesse os seus «amigos». Em suma, para que estivesse à vontade. Mas Dali, ao princípio, era fiel a Gala.
Uma modelo que tinha os seus dezassete ou dezoito anos, que servia de tema para uma pintura que Dali executava no seu estúdio, posava nua. Dali pintava e pintava, mas às tantas não se aguentou. Foi até a essa modelo e começou a roçar-se nela. Esta ficou surpreendida mas colaborou. Dali andou para ali até que ejaculou. No fim, pediu-lhe desculpa por não a ter penetrado, mas «era fiel a Gala».

Hoje lembrei-me de Dali, talvez por causa de uma «conversa» que tive com o Bock em que, no delírio do fim do dia, escrevemos qualquer coisa acerca de girafas.

E é isso.

terça-feira, junho 14, 2005

O HOMEM NO CASTELO ALTO

Lopes saboreava a sua confortável maioria absoluta nas Legislativas do alto do Castelo de S. Jorge, agora a residência oficial do Primeiro-ministro. Suspirava, apreciando a vista sobre a cidade enquanto a secretária lhe fazia um repenicado fellatio, acocorada debaixo da secretária de ouro encastrada de pedrarias e madrepérola. Com as mãos atrás da cabeça, remoía as palavras do novo Governador do Banco de Portugal, o Doutor Gilberto Madaíl – “Ó sô doutor Primeiro-ministro, deixe lá isso. É só um défificezinho de 18, 5 %. A Republica Centro Africana tem 76, 7 % e eles não se queixam…” Sábias palavras. As hordas de ex-funcionários públicos, que entretanto abandoram os postos de trabalho, exauridos que estavam os cofres do Estado, assolavam agora as ruas com navalhas de ponta-e-mola e seringas infectadas com escorbuto, assaltando os cidadãos que faziam bichas de vários quilómetros, de senha de racionamento na mão, á porta das padarias e dos minimercados LIDL, aos quais tinha sido confiado o Ministério da Economia. Outros, dedicavam-se a abater as árvores dos jardins para suprir as necessidades de combustível, por via da derrapagem para mais de 400% do Imposto sobre os Combustíveis. A tecnologia do gasogénio de gás-pobre de lenha tinhasido, por isso, recuperada por necessidade e era um bocado triste ver os patos-bravos nos seus Audis A8, a rebocar o engenho pelas ruas de Lisboa a 15 km/hora – tchug, tchug, tchug…. Os ministros, deputados, autarcas e os agora Vice-Reis Vitalícios (ex- presidentes de Governos Regionais) com os seus chorudos subsídios de reintegração, que recebiam ainda em funções, viviam num luxo asiático em suites de luxo do Sheraton-Santana, que tinha sido arrendado pelo Governo, pois a maioria dos edifícios públicos tinha sido alugado a famílias de ciganos como armazém de alcatifas, burros e heroína. Como o ouro tinha sido todo vendido e Portugal expulso da União Europeia, o Escudo voltara a circular e as pessoas debatiam-se para viver o seu dia-a-dia com dignidade. A inflação semanal de 200% tinha obrigado a que a República tivesse contraído uma dívida monstruosa junto da República Popular de Moçambique. Por isso o metical, no mercado negro, era agora a moeda forte do país. Uma couve custava 50.000 escudos e um papo-seco 35.000. Os cambistas chineses de rua, trocavam vantajosamente as duas moedas, valendo um metical cerca de 15.000 escudos.

Lopes pensava no doutoramento Honoris Causa que Universidade Católica lhe tinha atribuído no dia anterior, mais a beatificação-expresso prometida pelo Padre Melícias, que agora era o Cardeal Patriarca, enquanto a Domitília Guedes lhe sugava com gula o prepúcio já muito enrugado de passar tanto tempo molhado pela saliva. Nisto, entrou o Presidente da Assembleia da República, o Comendador Alberto João Jardim, aos tropeções. Estava com uma grandessíssima sovela pelos queixos, como de costume. Enjoado do cocktail de poncha, vinho da Madeira e pontapé-na-cona, vomitou nos tapetes kilim de seda selvagem do PM. – “Pôrra, ó Alberto João, já o outro dia espatifaste-me o jarrão Ming. Há duas semanas rasgaste-me o biombo Namban, agora esta merda… Não consegues vir aqui sem fazeres estragos…”.O Presidente da Assembleia, que acumulava o cargo de Vice-Rei e de administrador da EPPJE (Empresa Pública de Prostituição, Jogo e Extorsão), pediu desculpa entre duas golfadas de vómito. Quem se lixou, foi a Domitília que levou com o jacto de vomitado em cima. – “Devias ter aqui um balde”. – Disse AJJ. – “Mas eu vinha aqui por causa de outra coisa.

-“Diz lá.”

- “Tenho aqui já passado a stêncil, o texto da Declaração de Guerra a Espanha, para seguir para a Comissão Parlamentar. Está cheia de gralhas. Não posso deixar isto assim…Está uma vergonha. ”

- “Puta da secretária. Ela andou no curso nocturno para acabar a C+S. Devia ter mais brio. Mas faz uns bicos de se lhe tirar o chapéu, sabes?...”

- “Acredito. É aquela que fez uma operação ao palato numa clínica em Badajoz para conseguir abocanhar o Mantorras?”.

- “É essa mesmo”.

Nisto, uns militares liderados pelo General Vasco Lourenço (a arrastar a algália), entram de rompante pelo gabinete adentro, aos gritos – “Isto é uma Revolução!!!! Mãos no ar!...”

- “Pfff…Desde que me deixe a pensãozita, o cartão do Plateau e o lugarzinho no Conselho de Estado…”- Disse o Lopes.

Todos se entreolham.

Fez-se um longo silêncio

- “Vamos mas é embora.” – Diz o General.

- “Vamos”- Diz o Lopes, enquanto o AJJ abana a cabeça anuindo.

FIM


segunda-feira, junho 06, 2005

DANGER MOUSE




Adorava esta série de desenhos animados. Tinha episódios pequeninos, que eu via às oito e meia da manhã, andava eu na terceira classe.

Belos tempos.

Lembram-se disto?

He's The Best
He's The Greatest
He's The Greatest Secret Agent In The World!
He's The Ace - He's Amazing...
He's the Strongest... He's The Quickest... He's The Best!

Saudades...

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