segunda-feira, junho 27, 2005 |
Em mês de Santos Populares...
A devoção pelos santos é muito portuguesinha. Claro: não nos custa a aceitar que Deus há só um – que na verdade são três que formam um só, salvo o erro… – e que não lhe conheçamos o rosto senão como recompensa por uma vida justa e sofrida no Dia do Juízo Final, quando já não podemos comentar com ninguém qualquer coisa do género “Vai-se a ver e o gajo parece o baixista dos ZZ Top!!”. A Imaculada Concepção por obra e graça de uma pomba, a vida, a morte e a ressurreição de Cristo, a Santíssima Trindade e os restantes dogmas da Igreja não fazem espécie ao português. Agora, não nos podiam pedir para engolir isto tudo assim às secas, não! Para que um português se sentisse seguro com o catolicismo era necessária a figura do intermediário. E é aí que entram os santinhos.
O processo de canonização é, aos olhos lusitanos, um processo de desumanização, em que o/a eleito/a transcende a existência material e assoma à categoria de mito. Para nós, o que interessa não é o que o santo fez em vida nem a forma como foi martirizado; o que nos interessa é que ele já está “lá em cima” e pode servir de cunha para as nossas precisões.
Tal como o português segue mais depressa o alvitre do vizinho hipocondríaco que o do farmacêutico ou do médico, também se fia mais nos santos que em Deus Pai Todo Poderoso. É-nos intrínseco: é que os santos podem sempre dar um jeitinho enquanto que com Deus as coisas já piam mais fino, há uma espécie de livro do deve e do haver e nós nunca fomos de boas contas…
Acho fascinante aquela espécie de “tabela de emolumentos” para a graça que se pretende: nas pequenas aflições não vale a pena maçar as altas figuras da hierarquia celestial; se o caso já é mais sério vamos a Nossa Senhora de Fátima que “ao menos percebe o que nós dizemos e sempre é mais séria que a Nossa Senhora original, já que a nossa, ao menos, não consta que tivesse ficado prenhe de algum melro que estivesse na azinheira”; se o caso é de vida ou de morte, aí – e só aí – recorremos ao “Supremo Tribunal” ainda que privilegiando sempre a figura do Filho, que sempre andou cá em baixo e até devia ser um gajo compincha, capaz de fechar os olhos às nossas pequenas faltas.
E os padres? Bom, os padres são uma espécie de “porteiro da repartição”, o gajo que convém conhecer porque pode deixar cair uma palavrinha em nosso favor. Mas o santo, o santo é que é a figura chave: o artolas que conhece toda a gente e que resolve quase tudo, com a nítida vantagem de aceitar que lhe paguem o favor a pronto e de uma vez só, evitando assim que fiquemos na obrigação de lhe dar uma garrafa de uísque (e mai’la caixa de Ferrero Rocher para a patroa…) todos os Natais.
Por isso, celebrar os Santos Populares é uma expressão de patriotismo; de um patriotismo esclarecido e convicto das nossas prevaricações colectivas e dessa certeza de que, mais do que os grandes feitos, o que une verdadeiramente um povo é a consciência dos defeitos que partilha.
O processo de canonização é, aos olhos lusitanos, um processo de desumanização, em que o/a eleito/a transcende a existência material e assoma à categoria de mito. Para nós, o que interessa não é o que o santo fez em vida nem a forma como foi martirizado; o que nos interessa é que ele já está “lá em cima” e pode servir de cunha para as nossas precisões.
Tal como o português segue mais depressa o alvitre do vizinho hipocondríaco que o do farmacêutico ou do médico, também se fia mais nos santos que em Deus Pai Todo Poderoso. É-nos intrínseco: é que os santos podem sempre dar um jeitinho enquanto que com Deus as coisas já piam mais fino, há uma espécie de livro do deve e do haver e nós nunca fomos de boas contas…
Acho fascinante aquela espécie de “tabela de emolumentos” para a graça que se pretende: nas pequenas aflições não vale a pena maçar as altas figuras da hierarquia celestial; se o caso já é mais sério vamos a Nossa Senhora de Fátima que “ao menos percebe o que nós dizemos e sempre é mais séria que a Nossa Senhora original, já que a nossa, ao menos, não consta que tivesse ficado prenhe de algum melro que estivesse na azinheira”; se o caso é de vida ou de morte, aí – e só aí – recorremos ao “Supremo Tribunal” ainda que privilegiando sempre a figura do Filho, que sempre andou cá em baixo e até devia ser um gajo compincha, capaz de fechar os olhos às nossas pequenas faltas.
E os padres? Bom, os padres são uma espécie de “porteiro da repartição”, o gajo que convém conhecer porque pode deixar cair uma palavrinha em nosso favor. Mas o santo, o santo é que é a figura chave: o artolas que conhece toda a gente e que resolve quase tudo, com a nítida vantagem de aceitar que lhe paguem o favor a pronto e de uma vez só, evitando assim que fiquemos na obrigação de lhe dar uma garrafa de uísque (e mai’la caixa de Ferrero Rocher para a patroa…) todos os Natais.
Por isso, celebrar os Santos Populares é uma expressão de patriotismo; de um patriotismo esclarecido e convicto das nossas prevaricações colectivas e dessa certeza de que, mais do que os grandes feitos, o que une verdadeiramente um povo é a consciência dos defeitos que partilha.
Arrotos do Porco: