terça-feira, maio 31, 2005 |
Havia, certa vez, um idoso rezingão e maldisposto que passava a velhice dedicado à pouco nobre missão de tornar a vida dos que o cercavam tão desagradável como a sua. “Lá vai o cabrão dos maus fígados!”, diriam uns; “Lá vai o Chico Zé!”, diriam os mais educados. E ele lá ia, passando os dias na rua, escolhendo as horas de maior movimento para fazer aquilo que mais pessoas estivessem a fazer: ou na fila dos Correios para “cobrar o cheque da pensão”, ou na paragem do autocarro, ou nas Tesourarias da Fazenda Pública nos últimos dias de entrega das declarações do IRS. O seu faro apurado levava-o ao mais improvável dos ajuntamentos, quer tivesse ou não qualquer coisa para fazer ali. Como morava mesmo ao lado da estação dos Correios na Rua das Mercês, passava ali todos os dias para tomar o pulso ao ambiente. Se via pouca gente, ia-se embora com um seco bom dia. Se via muita, lá ficava na fila com o pretexto de telefonar para um sítio qualquer de onde nunca atendiam. O importante era estar na fila.
- O senhor não se esteja a chegar à frente que eu posso ser velho mas não sou parvo, ouviu? Estou aqui há mais de meia hora e o senhor pensa que chega aqui e é sempre a andar?! Olhe que toda a vida ouvi dizer: quem vem atrás molha no vinagre!
- Mas eu só ia pedir uma esferográfica!
- Pois pois! Com as calças do meu pai também eu era um homem! Vocês pensam que nos atiram areia para os olhos! Como são velhos é passar-lhes à frente!
Ainda que o visado se colocasse no seu lugar devido na fila ou saísse da estação, Chico Zé não parava:
- E esta cambada de velhas sonsas não é capaz de abrir a boca! Depois admiram-se de ser roubadas e mais não sei quê! Não se dão ao respeito, é o que é! Depois admiram-se! Eu é que me admiro como é que não se põem ali dois ou três meliantes à porta da estação… era como limpar o cu a meninos!
- Então mas não vê que está ali um polícia?
- Polícia?! Você chama àquilo polícia?! Era o primeiro a fugir se aparecesse algum gatuno! Ainda há pouco saiu dos cueiros e já lhe vestiram a farda! Aquilo é um verbo-de-encher que ali está! Mais valia pôr um espantalho que ao menos não come nem caga!
- Ó homem!, cale-se!
- A senhora não me manda calar, ouviu?! A mim ninguém me manda calar!! Isso era noutros tempos!... Tens pinta de retornada, deves andar habituada a mandar! Mas olha que eu não sou preto, ouviste?!
Tudo isto para desembocar no desabafo do costume, quando chegava a sua vez de ser atendido:
- Mas uma pessoa sai de casa para quê? Para ser ofendido?!
A bem da verdade, uma pessoa era o bastante para que Chico Zé desse largas ao seu entusiasmo. Tinha por hábito estacar de repente nos passeios mais movimentados – e se alguém lhe pedia licença para passar lá vinha o arrazoado do costume:
- Pois pois… o velho está a estorvar, não é?! Uma pessoa pára dois minutos para recuperar o fôlego e leva logo rodas de parvo! Olhe que se eu sou velho é por direito mas você é estúpida por natureza, ouviu?! Muito empertigadinha, não lhe cabe uma lentilha no cu, mas no que toca ao respeito está mais nua que uma cadela! Quando chegar à minha idade é que vão ser elas! Aí é que vai ver se também gosta que a empurrem do passeio!
- Mas eu não o empurrei! Eu só lhe pedi licença!
- E ainda é capaz de dizer que não me empurrou, a sirigaita! Já não me admira que elas ganhem mais que os homens, hoje em dia! Não têm vergonha nenhuma, nem para abrir a boca nem para abrir as pernas! Isto está bem entregue, não haja dúvida!... E não me venha para cá dizer que é você que paga a minha reforma, ouviu?! ‘Inda lhes acho graça com essa de nos pagarem as reformas, pffff! Só o interesse que eu dei ao país toda a vida paga a minha reforma e a de mais quinze como eu! Quinze!, ouviu?! Eu trabalhei nas obras da Exposição do Mundo Português ainda você andava nos colhões do seu pai!! E agora vem-me para aqui dizer que os velhos são uns chulos, é?! Vocês é que nos chulam a nós!! Anos e anos nas “aniversidades” a passear os livros para dizerem que são doutores! Doutores, pffff! Para mim, doutores só houve dois, ‘tá a ouvir?! Foi o Sousa Martins e o Salazar!!
Como vivia sozinho, Chico Zé aproveitava para amortizar o passe social passeando de autocarro nas horas de ponta, ocasião que permitia regularmente umas interessantes trocas de ideias:
- A um velho doente ninguém dá o lugar mas se fosse uma mulher prenha levantavam-se logo…
- Mas o que é que tem a ver…
- O QUE É QUE TEM A VER?!! Ahh ainda pergunta?! Se ‘tá prenha é porque fodeu! Agora aguente-se, hom’essa! Eu não escolhi ficar velho mas ela escolheu apanhar com ele na pássara, não foi?! E depois ‘inda se vêm queixar que lhes dói as costas ou o catano… Havia de ser eu a mandar nisto só que fossem quinze dias!... Levava cá uma volta!... Isto ficava mais direitinho, ficava!... … … olha-me para os preparos desta gente! Eu ainda sou do tempo em que quem pintava os lábios eram as putas!!! Mas as putas do meu tempo eram mais sérias que as mulheres de hoje em dia!!! … … … olha-me ali o raio do preto a tentar roçar-se na rapariguita! oh oh oh… então mas o que é isso?! Não te ensinaram maneiras lá na merda da tua terra?! Olha que o meu irmão matou muitos como tu lá na…
Nisto, vzzzzzzzzzt!
Moral 1: os avisos da Carris sobre a conveniência de os passageiros se segurarem bem quando viajam de pé são para ser levados a sério.
Moral 2: ainda não foi devidamente valorizada a importância do clima enquanto tema de conversa anódino e inócuo, preferível o mais das vezes a outras trocas de opiniões.
terça-feira, maio 24, 2005 |
JAZZ EM PORTUGUÊS
Aposto que nunca ouviram. Pelo menos, a maior parte de vós. Eu já tive esse privilégio. Sim, porque é de um privilégio que se trata.
E com uma das melhores vozes portuguesas dos últimos vinte e cinco anos: Lena d’Água. Só ouvido e visto, mesmo. E dou primazia ao ouvido porque é disso que se trata: ouvir, simplesmente. Deixar-nos levar pela clara e cristalina voz da cantora, embalados pelos sons de jazz que a envolvem e a acompanham.
Pois é, meus amigos, há uma oportunidade única de assistirem a isto, ou melhor, três oportunidades únicas. Escolham o dia e vão, não olhem para trás e avancem, entrem pela noite lisboeta e vão até ao Hot Clube. Uma vez chegados lá, certifiquem-se que é quinta-feira, sexta-feira ou sábado e que estão no mês de Maio do ano de 2005 da Graça de Nosso Senhor. Perguntem-se se o calendário baterá certo com os dias 26, 27 ou 28.
Se tiverem acertado nestas variáveis todas, preparem-se para uma experiência nova: ouvir jazz cantado em português, interpretado pelo Quarteto de Lena d’Água, constituído pela própria e por Bernardo Moreira (contrabaixo), André Fernandes (guitarra) e Marco Franco (bateria). Como convidado, o trompetista João Moreira.
É um quarteto constituído pelo que de melhor se faz por estas bandas.
Autores como Jorge Palma, José Mário Branco ou José (Zeca) Afonso são interpretados de forma magistral e com uma sensibilidade extraordinária.
A não perder, a sério. Para mais informações não há nada como ir directamente às fontes: falem com a cantora no belogue desta, visitem o site do Hot Clube Portugal e não se esqueçam das noites de 26, 27 e 28. Durmam bem no feriado e saiam à noite. Ou então, prolonguem um pouco a sexta-feira e vão divertir-se até ao Hot Clube. Bebam um gin tonic que eles sabem prepará-los bem. Também, as coisas não começam nem acabam tarde: pelas 23 horas tem início o primeiro set. Depois, ainda têm sábado pela frente e domingo para descansar.
Eu estive lá no ano passado. Vale a pena.
sexta-feira, maio 20, 2005 |
O Zeca Galhão foi pai outra vez! Com esta é a segunda – que ele nos conte. Fiquei muito feliz com a novidade. Primeiro, é sempre bom saber que há mais uma criança bem entregue e que corre um sério risco de ser feliz e muito bem tratada. Depois, é sempre bom saber que há mais uma criança que, daqui a uns anos, vai estar a descontar para a minha reforma. O Zeca Galhão é cá dos nossos, é um “hard-liner” da Vara e nós estamos muito contentes porque a Princesa já não vai brincar sozinha.
II.
Quarta-feira fui ver o grande Momus ao Santiago Alquimista. Eu e mais umas cinquenta pessoas tivemos o bom senso de afogar as mágoas da final da UEFA ouvindo um enorme escritor de canções que é, ao mesmo tempo, um dos melhores poetas contemporâneos – isto na minha humilíssima opinião. Vai daí, retomando os bons hábitos – que, como é sabido, fazem os bons monges – deixo-vos na língua de Alice Vieira e Mécia de Sena a tradução dessa canção magistral que Momus interpretou “by special request” e que se chama…
Murderers, the hope of women
With this knife I cut the cake
Tenho um bolo e uma faca no alforge
Who will be my bride today
Quem será a minha noiva, hoje
Sweet Fanny Adams
Doce Tatiana
Watch her climb the step ladder
Vai subindo a escadaria
A present from her stepfather
Que o padrasto fez na carpintaria
Sweet Fanny Adams
Doce Tatiana
See her reaching out and stripping down the muslin drapes
Os cortinados que ela rasga são feitos de mousselina
A cover for her nakedness, a veil for her face
E tapam o seu rosto e a nudez tão feminina
With curtains for your wedding dress
Com um cortinado por teu vestido
You must take your place amongst
Chegou altura de tomares partido
The Proper Little Madams
Pelas Jovens Debutantes
And now because I love you
E porque eu te curto à brava
I must take my place too
Um ferrete em mim se crava
Amongst the murderers, the hope of women
P’ra gáudio das mulheres, sou assassino
Death in every new beginning
Faço “resets” ao destino
I must take this woman for my sentence of life
És tu quem eu quero para me condenar
And she must take my knife
Eu vou-te chinar
I will buy a ring of gold
Um anel de pedra polida
And you will practise birth control
É teu se usares espermicida
Sweet Fanny Adams
Doce Tatiana
Like a puppet on a string
Como uma boneca articulada
Of oestrogen and progesterone
Geneticamente modificada
Sweet Fanny Adams
Doce Tatiana
This is where your misery starts
Hoje eu vou-te fazer mal
This is where your mystery stops
Hoje vou-te tirar a parra
We'll rent a television
Vemos o Telejornal
To replace Pandora's Box
Em vez de ouvir o Bandarra
And I will wear a business face
A minha expressão profissional
And you will learn your proper place
E o teu talento social
From those Proper Little Madams
Dessas Jovens Debutantes
And in my world of cut and thrust
E no meu mundo de esquizofrenia
I will learn that my place, my place must .....
Sempre soube onde é que pertencia, eu sabia…
Be with the murderers, the hope of women
Que, p’ra gáudio das mulheres, sou assassino
Death in every new beginning
Faço “resets” ao destino
I must take this woman for my sentence of life
És tu quem eu quero para me condenar
And she must take my knife
Eu vou-te chinar
In my pipe and slippers
Com o hálito a tabaco
Do I look like Jack The Ripper?
Pareço um dos Irmãos Cavaco?
Sweet Fanny Adams
Doce Tatiana
But I poisoned you with every kiss
Mas cada beijo era um mau sinal
Smothered you with domestic bliss
De perfídia na vida conjugal
Sweet Fanny Adams
Doce Tatiana
Underneath the suntan from the sun lamp that we bought
Na cama solário que compraste no e-bay
Your face is paler than the pale face of a corpse
Ficas mais pálida que o Benjamin Biolay
And from the seventh floor of our bungalow
E do ponto mais alto do Chapitô
You flung yourself down to where they stood below
O teu corpo caiu até que aterrou
Those Proper Little Madams
Como uma Jovem Debutante
But in white hair, wrinkles and false teeth
Mas com roupas e peruca da Teresa Ricou
I escaped detection by the police
Nenhum polícia em mim reparou
One of the murderers, the hope of women
P’ra gáudio das mulheres, sou assassino
Death in every new beginning
Faço “resets” ao destino
I must take this woman for my sentence of life
És tu quem eu quero para me condenar
And she must take my knife
Eu vou-te chinar
Então bom fim-de-semana e não alimentem pulsões homicidas até que sejam conhecidos os vencedores da Super Liga e do Festival da Eurovisão.
domingo, maio 15, 2005 |
Os amendoins Matulão têm aquele saborzinho forte e apimentado porque as operárias que os descascam e embalam lá em África, os passam religiosamente um a um pelos sovacos suados?
Deus é o único que consegue meter o seu próprio joelho no cu?
A cortiça é a casca dos sobreiros?
Em Banguecoque há bares cujo chão é de espelhos e as empregadas não usam cuecas? Excepto as que varrem as caspa do chão, claro.
Os bois também dão leite? Mas muito menos quantidade e muito mais trabalho a ordenhar, claro.
Que os cães, além de andarem completamente nus na via pública, estão crus?
sábado, maio 14, 2005 |
quarta-feira, maio 11, 2005 |
O próximo dia treze, para além de coincidir com o dia de Nossa Senhora de Fátima, calha a uma sexta-feira.
A origem da superstição que rodeia a sexta-feira, treze, tem, como quase tudo, uma explicação histórica.
Por acaso já alguma vez se perguntaram qual é a origem desta superstição?
Os Templários, estão a ver? Não, não é aquele bar ao pé do Quarteto. Falo dos Templários propriamente ditos, os da ordem religiosa, que participaram nas Cruzadas e que eram os exércitos da Fé e guardiães das enormes riquezas de vários reis.
Ora bem, estes senhores Templários eram possuidores de um grande domínio territorial, reunido precisamente através das suas lutas e conquistas. Este facto é outra coisa que não percebo: se eram gajos para se despojar de todos os bens materiais, por que é que a Ordem religiosa a que pertenciam tinha tanta coisa? E, quem leu a «História do Cerco de Lisboa», de José Saramago, ou se reporta aos factos históricos que ocorreram verdadeiramente, percebe que os Cruzados (na sua maioria Templários) só ajudaram o nosso Afonso Henriques a conquistar esta terra - que tem uns preços imobiliários do camandro - a troco do saque e de outras regalias que o nosso primevo Rei e fundador da Pátria Lusa lhes prometeu. Interesseiros, é o que é!
Mas tergiverso. Pegando novamente no fio que nos leva à meada, os senhores Templários geraram a inveja de outros gajos poderosos, entre os quais um tipo mau e perverso que até era Rei de França. Falo de Filipe IV, o Belo (suponho que um parente longínquo desse outro facínora que dá pelo nome de Menir…), que era, digamos, o «master of puppets» do Papa Clemente V, a quem tinha ajudado a elevar-se ao trono papal.
Os Templários obedeciam apenas ao Papa - sendo um exército poderosíssimo - e punham-se ao serviço da Fé, conquistando e defendendo a Santa Terra, ora dando na trombeta dos Mouros, ora levando na cornadura destes.
O certo é que o Filipinho IV precisava de orientar umas massas para o seu lado e, numa sexta-feira, 13 de Outubro de 1307, mandou prender todos os Templários da França e o seu Grão-Mestre, Jacques DeMolay.
Estes rapazes foram sujeitos à suavidade do tratamento da Inquisição e acusados de heresia. Escusado será dizer que nunca mais conseguiram reerguer a Ordem dos Templários e muitos até foram assados na fogueira purificadora.
É de realçar que o Grão-Mestre, ao ser envolto pelas chamas e devorado pela pira, gritou: «Papa Clemente, cavaleiro Guilherme de Nogaret, Rei Filipe... Convoco-os ao Tribunal dos Céus antes que termine o ano, para que recebam vosso justo castigo. Malditos... Malditos... Malditos... Sereis malditos até treze gerações...».
Em concreto, sabe-se que os senhores em causa tinham abandonado a qualidade de sócios do Reino dos Vivos antes de finalizar o ano. Tenham medo, tenham muito medo…
Em Portugal, D. Diniz não acredita nas acusações formuladas e funda a Ordem de Cristo, para onde transitam alguns dos Templários. Já éramos porreiros nesses tempos…
É a história da sexta-feira, treze.
De aqui a dia e meio começa uma. Tende cuidado, não venham a ser excomungados…
segunda-feira, maio 09, 2005 |
Tell me now, how do I feel?
Com as minha homenagem ao g2 que foi o primeiro a instar-me a uma resposta, ao qual peço compreensão pelo atraso, (pois tenho andado com uma vida que nem permite aproximar-me do computador) e ainda a mais outro amigo que me pede que responda a esta coisa dos livros, cá vai:
Não podendo sair do Fahrenheit 451, que livro quererias ser?
Não sei se conseguiria decorar um livro inteiro como no filme, mas talvez escolhesse o Isa Upanishade, pois só tem dezanove versos. O livro das letras dos Joy Division, não tanto pela qualidade poética mas pelo facto de já as saber de cor. Ou então e com mais esforço, mas mesmo do coração, decorava o Ficções do Jorge Luís Borges. Esse sim. Meu Deus….
Digo-vos também alguns que certamente não decorava, pois nunca pus tamanho lixo à frente dos olhos: O Calendário de Córdova e As mulheres deviam vir com Manual de Instruções (nem quero lembrar os autores).
Já alguma vez ficaste apanhadinho por uma personagem de ficção?
Apanhado a ponto de querer ser o personagem, não. Os gajos que eu quereria ser são ou foram naturalistas e poucos escreveram ficção. O Alexander von Humboldt que escreveu livros verdadeiros acerca da sua própria vida, por exemplo.
Qual foi o último livro que compraste?
The Crack in Space do Phillip K. Dick. Mete pitecantropos e políticos populistas. Encheu-me as medidas.
Qual foi o último livro que leste?
O Pão dos Deuses do Terence McKenna. A minha mulher recomendou-mo há uns sete anos atrás. Só agora li. É sobre drogas visionárias e xamanismo e o seu suposto papel na evolução da mente humana desde os primórdios da Humanidade. Não completamente convincente, mas culto e coerente. Um gajo do arco-da-velha, este etno-farmacologista, antropólogo e guru psicadélico. Experimentou-as todas. Morreu há uns três anos, de cancro (não foi de overdose, não senhora).
Que livros estás a ler?
Uma biografia do Lamark (um naturalista francês do séc. XVIII).
Que livros (5) levarias para uma ilha deserta?
As obras completas do Jorge Luís Borges. Dispensava (a custo) o último volume, que foi escrito a meias com o Adolfo Bioy Casares.
A quem vais passar este testemunho (três pessoas) e porquê?
Passo á Vara e aos Três Porquinhos, porque sim.
quinta-feira, maio 05, 2005 |
Dois entomologistas americanos - Quentin Wheeler e Kelly Miller - descobriram três espécies novas de carochas e resolveram homenagear o Presidente dos Estados Unidos, o vice-presidente e o secretário da Defesa, respectivamente George W. Bush, Dick Cheney e Donald Rumsfeld.
Já não lhes bastava serem escaravelhos e ainda se passaram a chamar Agathidium bushi, Agathidium cheneyl e Agathidium rumsfeldi. Disseram os senhores que era uma homenagem sincera e disso eu nem tenho dúvidas, mesmo porque um deles já tinha dado o nome da mulher a outro insecto que tinha descoberto.
A mulher não foi a única a ficar agradada com a homenagem, o senhor presidente dos Estados Unidos ficou tão sensibilizado que telefonou a agradecer dizendo-se honrado com o gesto dos senhores.
Vai daí pensei que talvez o nosso ilustre AdaS resolvesse homenagear alguém se descobrisse a tal da nova espécie de Neotinea , seja lá o que isso for que agora não me apetece ir consultar o Dr. Google.
Se me quiser para madrinha cá vai: Neotinea sampai ou Neotinea socrati. Mas se a dita cuja for bonita e simpática eu propunha Neotinea tampi.
terça-feira, maio 03, 2005 |
O Senhor Selvagem desafiou-me a responder a uma espécie de “diz-me que livros lês dir-te-ei quem és” de pacotilha que vai circulando por aí. Eu não sou gajo para me agachar ante um desafio, ai isso é que não sou! Vai daí, tirei-me dos meus cuidados e alinhavei as respostas que seguem a este prenúncio dos inquéritos de Verão que brevemente assolarão a desmiolada imprensa portuguesa. Ora…
Não podendo sair do Fahrenheit 451, que livro quererias ser?
Quereria ser Fahrenheit 451, de Ray Bradbury, dando origem a uma pescadinha de rabo-na-boca literária em que, qual Penélope que trocasse o tricô pelas letras, o autor continuamente criasse e destruísse a mesma obra – no fundo, seria uma homenagem em prosa àqueles que, como eu, já deram joelhadas incautas no malfadado botão “restart” de alguns PC’s sem terem gravado os documentos em que estavam a trabalhar…
Já alguma vez ficaste apanhadinho por uma personagem de ficção?
Muitas vezes. Desde a Ana d’Os Cinco até a uma menina chamada Paula Oliveira de quem o meu pai me falava e que afinal não existia e era só um pretexto para eu comer a sopa, foram muitos os arroubos por personagens de ficção. O mais forte talvez tenha sido por Isabel II no A Rainha e Eu, de Sue Townsend…
Qual foi o último livro que compraste?
O Norwegian Wood, do Haruki Murakami. Foi por razões profissionais, claro: um aspirante a gajo cool e meio urbano-depressivo como eu nunca compraria de moto próprio um livro que traz escrito na capa “Mais de 4 milhões de exemplares vendidos em todo o mundo!”, nunca. Para já, parece-me muuuuito original: é o primeiro livro que leio em que o narrador rememora o seu passado e pensa nas pessoas que conheceu e nos amores que correram mal, tudo sob um véu de alguma nostalgia açucarada. A tradução parece-me ser acintosa mas não domino o japonês o suficiente para ler no original… Para o mês que vem compro antes a Gina, que costuma ter histórias parecidas mas mais ilustrativas.
Qual foi o último livro que leste?
O Embrace, do sul-africano Mark Behr. E que grande livro! Oitocentas e tal páginas em letra miudinha! E ainda por cima está escrito em estrangeiro! É um bocadinho fanchono, à imagem do autor, mas acho que foi o melhor livro que já li sobre alguns aspectos da adolescência e sobre a descoberta da voz enquanto instrumento e sobre a África do Sul. A DIFEL publicou em Portugal o primeiro romance do Behr, O Cheiro das Maçãs, mas este deve ser uma carga de trabalhos para traduzir.
Que livros estás a ler?
Isso… isso é uma história muito comprida… Não acredito que os livros sejam para ler de enfiada ou com disciplina. Isso fazia-se com os porcos, dantes: matava-se um porco e ia-se comendo a eito, do mais perecível para o menos. Com os livros não vale a pena – eles não apodrecem e a mosca da fruta não simpatiza com eles. De maneira que os vou lendo, um dia um, um dia outro, um dia mais um e mais outro e ainda aquele que estava há meses em repouso. Entre os títulos mais relevantes que estou a ler tenho que destacar O novíssimo Príncipe, de Adriano Moreira, particularmente pertinente nas cercanias de mais um 25 de Abril; os quatro volumes da Defesa do Estado Português da Índia, publicados pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros; o Conselhos para Rapazes, do Dr. Georges Surbled, célebre higienista francês que escreveu esta obra dirigida como um alerta moral aos jovens da primeira metade do século XX e que tem passagens ilustrativas sobre os malefícios do onanismo; e um pequeno opúsculo intitulado Razões para a presença de Portugal no Ultramar – excertos de discursos do Prof. Marcelo Caetano, porque é sempre formativo ver como se defende o indefensável. A juntar ao lote temos o incontornável Renato Solnado e o seu Nome de Thriller; o Álamo de Oliveira e o Pátio d’Alfândega – Meia Noite; Sampaio Bruno e A Ideia de Deus; Pier Paolo Pasolini e Uma Vida Violenta; Pierre Pierard e Uma História da Igreja; e mais um Douglas Coupland, e mais um Nick Hornby, e mais um Jonathan Coe, e mais a Aparição, a belíssima Aparição do Vergílio Ferreira, e mais O Homem Universal do Pascoaes; e mais um Vian e um Mann que me emprestaram e eu tenho que ler senão parece mal. E ainda haveria mais, mas assim o que se assume como um espírito caótico na leitura passaria por cagança e isso, meus amigos, isso é que não! Se há coisa por que sou reconhecido e louvado é precisamente pela modéstia que sempre me caracterizou!
Que livros (5) levarias para uma ilha deserta?
Lusts of a Moron, de Momus, vulgo Nicholas Currie; Matar-se a si próprio, de Aiddan Higgins; Doces e Cozinhados, de Isalita; um álbum encadernado a couro com vários volumes de Cruzadex e, obviamente, The Virgin Encyclopedia of 80’s Music.
A quem vais passar este testemunho (três pessoas) e porquê?
À Quinta Coluna, porque são nossos amigos.
Ao Impertinente, porque é verrinoso e cáustico e eu gosto.
Ao Sublimado e Corrosivo, porque me apetece.