terça-feira, agosto 08, 2006 |
Futurologia
Naquela altura estavam quase em eleições. Lá no partido andavam aflitos para constituir as listas de candidatos. A porra da lei da paridade já tinha sido promulgada há quase três anos, mas a prova definitiva de saber se iria funcionar ou não ia ter lugar agora.
- Que raio de ano de eleições... - pensava Josué ao cofiar a barba com um gesto largo. Esta era uma barba de estimação, que Josué cultivava há largo tempo, prestando-lhe todos os cuidados que a ciência dos champôs, amaciadores, cremes de dia e de noite, hidratantes e conservantes, tinha produzido.
Nada lhe era mais precioso. Nem a sua esforçada Maria, que com os seus 32 anos (trrinta-e-dois, como ela gostava de dizer) adivinhava todos os seus desejos, mantendo a casa limpa e com bom-gosto, sendo uma óptima anfitriã e recebendo como ninguém. Todos a elogiavam e Josué sorria para consigo cada vez que se lembrava da Maria na cama.
Maria era uma fera sexual e não se coibia a toda a espécie de jogos, quer de carácter físico, quer de carácter psicológico.
Uma vez mais, Josué sorriu para consigo, recordando-se da noite anterior, em que Maria o tinha desafiado para um jogo que se prolongou até quase de madrugada.
E Maria era inteligente, dominando todos os aspectos da vida urbana, desde o apoio social até ao panegírico político. Iria dar uma excelente candidata à Assembleia Municipal e previam-se intervençõpes fulgurantes e apaixonadas, como era apanágio de Maria, tendo Josué a certeza de que seria aclamada e amada pelo Povo, como já lho provara mais do que uma vez.
Maria era a perfeição em pessoa e Josué tinha plena consciência do facto. Ele próprio devia muito à vida política, tendo feito carreira nos últimos anos nessa área. Assumia-se como «político profissional», nada tendo a esconder quanto ao aspecto de assumir publicamente a aposta nessa área.
Estávamos em 2009 e finalmente iria aplicar-se a lei da paridade, que fora promulgada em 2006. Os 33,33% de mulheres impostas por lei nas listas candidatas era uma realidade de que não se podia esconder. Josué nunca percebera se os 33,33% já incluiam homossexuais e, em caso negativo, onde é que estavam as «reservas» feitas a favor deste grupo. E porque não os marrecos ou as marrecas? Se se queria igualdade nas listas, porque é que se baseariam apenas na diferenciação entre sexos e não seguiam um outro critério, por exemplo, «os jovens com menos de trinta anos»? E se, de repente, uma mulher se tornasse homem através de uma operação de mudança de sexo? Alterar-se-iam as listas?
Josué nunca conseguira descortinar a razão de ser desta «reserva» feita ao apelidado «sexo fraco». Até parecia que as mulheres estavam a aceitar este rótulo e a admitir que eram fraquinhas.
Isso não interessava nada. Era a oportunidade ideal para a sobredotada Maria entrar para a vida política e fazer furor.
É claro que Josué sopesou todos os argumentos e escolheu a D. Tânia, empregada de limpeza do Gabinete da Câmara, segunda classe de escolaridade e sem um grande rumo na vida, para ser candidata pela lista.
Afinal, interessava-lhe mais quem não pensasse muito por si próprio e que pudesse ser «orientado» para certas direcções do que alguém que pudesse ter alguma coisa interessante a dizer.
Nem o aspecto estético do panorama político nacional se iria alterar muito neste ano de 2009...