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Vareta Funda

O blog dos orizicultores do Concelho de Manteigas


sexta-feira, janeiro 14, 2005

ONTEM, HOJE E AMANHÃ

Ao Lourenço por apreciar o “The Chauffeur”; ao Diego pela “Aparição”; ao José Luís por, sem saber, me ter renovado a vontade de comprar o “Kilimanjaro”; à Lena d’Água pela conversa de ontem; aos meus irmãos por me terem permitido crescer com “isto” como moldura

Voltar a olhar para uns botões a que correspondem umas letras e pensar no que dizer pelos dedos. Acham que é fácil? Primeira questão: tenho alguma coisa de importante para dizer? Alguma vez tive?, segunda. Terceira: há coisas importantes ou existirá uma escala certificada da importância enquanto valor? O grande Vergílio Ferreira escreveu “A verdade é um erro à espera de vez” e isto era a verdade dele e a verdade de cada um não é mais do que isso, uma parcela insignificante em biliões de verdades. Procurar respostas para quê se podemos ser felizes a viver sem perguntar? Hum?

E isto a propósito de quê? A propósito de mim, claro. Mesmo que fosse a propósito de outros seria a propósito de como eu vejo os outros – vivo confinado a um eu, portanto; um eu apenas que é sempre um eu infinito e sem fronteiras. Como é que um gajo se aguenta neste balanço de ser minúsculo e infinito ao mesmo tempo? Hum?

Eu aguento-me como posso e aguento-me bem, ainda que sem saber como nem tendo vontade de me perguntar. E se me perguntasse não me angustiava: sei que não me quero responder. Acredito que são os outros “eu” que nos delimitam – não nos travam nem contêm, mas traçam “acidentes” que reencaminham a cartografia da nossa infinitude. Quanto mais conhecimento de mim atingir por meu intermédio, mais me expandirei para territórios que não poderei ocupar devidamente – apesar de meus. Quanto mais conhecimento de mim atingir por intermédio de outros, melhor saberei por onde seguir. Ou não? Hum?

Gosto de mim. É uma certeza inabalável. Há outros de quem gosto e que gostam de mim – tomando por válido esse precedente não tenho razões para não gostar de mim. Acredito numa “geopolítica de eus”, de alianças por afectos e identificação. E qual é o sentido de um eu infinito que não se basta e precisa de outros? Óbvio: ser um dos “outros” de um outro eu. Mas depois há uma questão do caraças: quando e como é que temos propriedade para usar a primeira pessoa do plural? Hum?

Nós. Esse eu exponencial, usado de forma tão ligeira. O universo de “nós” sinceros de cada um é necessariamente muito restrito: caramba, nós é uma comunhão de eus! E para ajudar à confusão: se cada eu é uma totalidade sem contornos precisos, cada eu deveria poder ser o eu que quisesse ser – e cada nós deveria ser um conjunto de “eus” que queriam ser nós. Ora, era aqui que eu queria chegar.

Será muito provavelmente uma deformação pessoal, mas nunca vi esta vertigem de liberdade individual tão bem expressa noutras áreas como a vi – e reparem que não digo vejo – na música. Sinto a falta dos autores de “eu” mutável, expansivo, inconstante e intemporal, dos que arriscavam ser – e parecer, permitam-me que destaque a importância pedagógica do parecer – os vários “eu” que queriam ser. Na música “pop”, área que quero abordar, o movimento terá começado com David Bowie e conheceu o seu apogeu, na minha opinião, com o neo-romantismo (e outros casos individuais como Julian Cope, nos Teardrop Explodes e a solo) dos inícios dos anos 80. Não me venham com merdas: aquilo não era “só visual”. Independentemente do que a música de grupos como Japan, Associates, Duran Duran, Classix Nouveaux, Heróis do Mar (porque não…), Spandau Ballet, Gary Numan, Human League (lamentavelmente os únicos referidos com gajas – e boas!), Ultravox, ABC ou esses rabetas-mor dos Culture Club (para ficar só pela rama) disser a cada um, havia uma apetência pela autodeterminação de um “eu” edificado de forma mais ou menos inteligente e que acabava por representar contínuos de atitudes – amante, guerreiro, cortês, sinistro (lembrem-se do Sal Solo de capa…), sedutor, herói, injustiçado, sofredor, reservado, distanciado, vitimado – projectados num cenário de modernidade e futurismo. Ora, era aqui mesmo que eu queria chegar.

Os “excessos” na definição individual de um conjunto de “eus” que decidem expor-se de forma a atingir um número significativo de outros – que não representam necessariamente um “nós” – fazem regredir territorialmente os “acidentes” que os outros nos levantam e aumentam a área cartografada para expansão segura de cada eu. Um eu é uma realidade total e única mas não conheço nenhum eu que seja totalmente dissemelhante de todos os outros que existem ou existiram. O que me parece é que a extravagância de um conjunto de “eus” (devidamente contextualizada: o Charles Mason também era extravagante…) é benéfica para todos, quer aproveitem ou não os caminhos (ou desvios) desbravados.

Não acham que fazia falta um “movimento” na música pop que voltasse a ser marcado mais pela adequação do som a um conceito de evolução, de futuro e de “contínuos de modernidade” que pela obediência aos ditames do mercado? Hum?

Arrotos do Porco:

=o) E um bom fim de semana, sem muito para pensar, que faz mal..




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