terça-feira, dezembro 28, 2004 |
De orelhas em pé - XVIII
A insuspeita TSF não resiste a descalçar a rude mas digna bota-todo-o-terreno-jornalístico e a enfiar a formosa patinha num plebeu chinelo, antes de a mergulhar por inteiro na poça. Já tal me tinha chocado num qualquer telejornal (confesso que não me ocorre se era directa ou indirectamente subvencionado pelo erário público - ou seja, eu e você) emitido em cima da hora.
A classe jornalística pergunta sempre "e os portugueses?", como se do estado de saúde dos naturais deste minúsculo rectângulo dependesse alguma coisa neste mundo ou se a nossa opinião contasse mais que a dos outros, nomeadamente dos directamente envolvidos nos factos. Perante o horror que se abateu, sem piedade ou aviso, sobre os países que bordejam o Oceano Índico, uma televisão (pelo menos) e a TSF falavam do "drama" dos portugueses que estavam de férias na Tailândia e em outros resorts igual ou superiormente paradisíacos e se viram, de repente, impedidos de regressar aos seus países.
Haja pudor, senhores. À hora que escrevo estão contados mais de 25.000 cadáveres e as perspectivas mais conservadoras apontam para, pelo menos, 40.000 mortos. Famílias inteiras, comunidades inteiras dizimadas, países de reduzidíssimos recursos com uma factura colossal a pagar só em danos materiais, e o "drama" de um punhado de portugas é notícia?
Arrotos do Porco:
A maioria das pessoas costuma dizer frases como: "...mas não foi cá...", "...se fosse com um filho meu..." Como se a distância fosse directamente proporcional à dor. Bem observado, como sempre, Menir Calém. |
A morte de milhares de pessoas é sempre obscena. Somos todos iguais numa tragédia deste nível. Mas o teu texto é de uma pertinência gritante. Afligiu-me ontem ver um depoimento de um português que lamentava que o seu hotel paradisíaco tinha sido destruído...Eu pensava como tu... e os milhares de pessoas que morreram e perderam tudo e que nunca viram o hotel paradisíaco? Morrem ainda mais infelizes? |