segunda-feira, abril 05, 2004 |
ELEKTRO KARDIOGRAMM
RALF HÜTTER FLORIAN SCHNEIDER FRITZ HILPERT HENNING SCHMITZ
Foi esmagador. Saí do Coliseu, citando um amigo meu, com o serúmen colado aos tímpanos. Há um grupo norte-americano pouco conhecido que tem como lema "Lowdness is power". Para os Kraftwerk, "Modulation is power". Quando abandonei a sala, os meus ouvidos carpiam de tristeza por deixarem aquele baixo perfeito, rigoroso, corpulento. Um baixo que quase fazia corrente de ar e que testava a solidez das madeiras do chão do Coliseu.
Tudo aquilo foi admirável. Uma sala na penumbra, um ecrã gigantesco, um som perfeito, vídeos fabulosos. Que importância poderia ter o facto de os quatro alemães não estarem propriamente a "tocar"? Nenhuma, claro. O importante era o rigor daquela relação entre o homem e as máquinas. Recordei as declarações de Karl Bartós, quando deixou o grupo: "Era como ter um jacto no quintal e nunca poder descolar". Bartós referia-se aos longos períodos de pretensa "inactividade" dos Kraftwerk, mas a espera vale a pena. Se o novo álbum e esta digressão são o fruto de 17 anos de trabalho, então cada dia valeu a pena.
Estes "musical workers", como eles se definem, que encaram as máquinas não como equipamento mas como colegas, conseguiram edificar nos últimos 30 anos uma obra tão escassa quanto monumental. Partindo da sensação de zero absoluto cultural da Alemanha do pós-IIª Guerra, os Kraftwerk mudaram - sozinhos - a face da música contemporânea. Sem os seus avanços, o hip-hop seria diferente, não teríamos house ou techno, nem o pop ou o rock teriam a mesma face que têm hoje. A revista inglesa UNCUT chamou-lhes os "Beatles do Krautrock", pretendendo indicar o seu grau de relevância - e só pecaram por defeito.
Ralf Hütter garantia, em entrevista recente, que o conceito Kraftwerk nunca estará terminado e que eles continuarão a trabalhar. Espero que sim, espero que regressem à clausura do Estúdio Kling-Klang (que não tem área de recepção, nem telefone, nem fax) e que continuem a mostrar como o cérebro humano pode continuar a trabalhar em conjunto com a tecnologia para dissecar em sons a beleza dos gestos do quotidiano. No panorama da música actual, eles são insubstituíveis, o que não se pode dizer de muita gente. Quem mais poderia pôr um Coliseu cheio como um ovo a vibrar com o conceito de "Elektro Cardiogramm"?
RALF HÜTTER FLORIAN SCHNEIDER FRITZ HILPERT HENNING SCHMITZ
Foi esmagador. Saí do Coliseu, citando um amigo meu, com o serúmen colado aos tímpanos. Há um grupo norte-americano pouco conhecido que tem como lema "Lowdness is power". Para os Kraftwerk, "Modulation is power". Quando abandonei a sala, os meus ouvidos carpiam de tristeza por deixarem aquele baixo perfeito, rigoroso, corpulento. Um baixo que quase fazia corrente de ar e que testava a solidez das madeiras do chão do Coliseu.
Tudo aquilo foi admirável. Uma sala na penumbra, um ecrã gigantesco, um som perfeito, vídeos fabulosos. Que importância poderia ter o facto de os quatro alemães não estarem propriamente a "tocar"? Nenhuma, claro. O importante era o rigor daquela relação entre o homem e as máquinas. Recordei as declarações de Karl Bartós, quando deixou o grupo: "Era como ter um jacto no quintal e nunca poder descolar". Bartós referia-se aos longos períodos de pretensa "inactividade" dos Kraftwerk, mas a espera vale a pena. Se o novo álbum e esta digressão são o fruto de 17 anos de trabalho, então cada dia valeu a pena.
Estes "musical workers", como eles se definem, que encaram as máquinas não como equipamento mas como colegas, conseguiram edificar nos últimos 30 anos uma obra tão escassa quanto monumental. Partindo da sensação de zero absoluto cultural da Alemanha do pós-IIª Guerra, os Kraftwerk mudaram - sozinhos - a face da música contemporânea. Sem os seus avanços, o hip-hop seria diferente, não teríamos house ou techno, nem o pop ou o rock teriam a mesma face que têm hoje. A revista inglesa UNCUT chamou-lhes os "Beatles do Krautrock", pretendendo indicar o seu grau de relevância - e só pecaram por defeito.
Ralf Hütter garantia, em entrevista recente, que o conceito Kraftwerk nunca estará terminado e que eles continuarão a trabalhar. Espero que sim, espero que regressem à clausura do Estúdio Kling-Klang (que não tem área de recepção, nem telefone, nem fax) e que continuem a mostrar como o cérebro humano pode continuar a trabalhar em conjunto com a tecnologia para dissecar em sons a beleza dos gestos do quotidiano. No panorama da música actual, eles são insubstituíveis, o que não se pode dizer de muita gente. Quem mais poderia pôr um Coliseu cheio como um ovo a vibrar com o conceito de "Elektro Cardiogramm"?
Arrotos do Porco: