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Vareta Funda

O blog dos orizicultores do Concelho de Manteigas


quinta-feira, março 04, 2004

GLUP GLUP DÓI DÓI TRUZ TRUZ PICA PICA



É triste, muito triste, mas é verdade, é mesmo verdade. Dói-me a garganta.

Eu, eu que já fui apodado com todos os nomes - em português e em latim - das mais distintas aves canoras, eu, cuja voz límpida e cristalina já encheu de alegria milhares de corações, eu, que tenho levado a canção portuguesa às sete partidas do mundo, eu estou com dores de garganta.

Não é a primeira vez. É óbvio que não é a primeira vez. Mas não é por ter fodido uma vez que um gajo deixa de querer foder, verdade? Daí que eu me queixe e continue a queixar até que esta porcaria passe.

Ainda tenho amígdalas. E lá vamos coabitando harmoniosamente durante boa parte do ano. Mas lá vem uma altura ou outra em que elas se organizam em jornadas de luta. São umas putas dumas revanchistas! Sempre o foram, não é de hoje nem de ontem. Eu conto-vos...

Só quando comecei a trabalhar é que passei a dar o devido valor a esta coisa de estar doente sem gravidade. Na minha adolescência, a merda das amigdalites era isso mesmo: uma merda. Um ou dois dias em casa, duas ou três noites em que não podia sair, febres altas, delírios... uma trip de mau ácido em pijama e sem gajas. Por isso mesmo, sempre tentei ocultar a minha condição de enfermo dos senhores meus pais e enfermeiros de serviço. Algumas vezes lá tinha sucesso: uma dose industrial de pastilhas e anti-gripais lá me conseguia aguentar durante a provação, sempre com um ar enérgico e sorridente. MAS, portuguesas e portugueses, MAS lá vinha aquela ocasião esporádica em que uma qualquer refeição deitava por terra o meu esforço. Sim, que estas cabras das amígdalas tinham valentes cunhas no estômago. E era certo e sabido que o conluio destes dois órgãos acabava por resultar num "roda-bota-fora" de efeitos impressionantes para quem tinha a sorte de comigo partilhar a mesa da refeição...

Lá ía eu ao médico, naquela idade em que ainda se vai acompanhado pelos pais mas já se sente vergonha por isso mesmo, e era humilhado com aquelas descrições: "Coitadinho, vomitou-se todo e está cheio de febre...". A terapia era invariável: uma injecção de penicilina, daquelas bem espessas, que têm de ser dadas depressa para o líquido não coagular. Invariavelmente também, a enfermeira era gorda e feia e velha e dizia-me: "Relaxe os músculos, relaxe os músculos que isto não custa nada.", enquanto eu pensava para comigo mesmo: "Deve ter sido isso que te disseram da primeira vez que te foram à bufa, cabra do caralho!". E estes pensamentos biliares e demoníacos distraíam-me da dor.

Nunca quis que se preocupassem comigo. O meu espírito, para uns, e o que tenho entre as pernas, para outras, sempre quis que fossem apenas fonte de alegria, bonomia, bons tempos. Estar doente era uma inversão nos papéis a que me acostumara: eu é que me sentia no direito de mimar, de "tomar conta", de tratar. Eu é que me preocupava com os outros e me ignorava. Mas estas putas, estas desprezíveis putas das amígdalas, lá vinham de vez em quando devolver-me a consciência de mim.

Uma dor de garganta é como uma excepção ao sistema de Schengen: habituamo-nos às fronteiras abertas e já não contamos com guardas fronteiriços hirsutos e assanhados. Nada disto é grave, mas incomoda. A decisão política de ir à farmácia deverá ser quanto baste para reconduzir a situação à normalidade. Serve tudo isto, igualmente, como aviso à navegação para os nossos comentadores: o meu estado clínico exime-me hoje a responder a eventuais inquirições sobre se engulo ou não engulo.


Arrotos do Porco:


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