segunda-feira, março 15, 2004 |
De orelhas em pé - XII
...e o impossível aconteceu. O PP espanhol, ainda assombrado pelo espírito de José Maria Aznar, perdeu as eleições em Espanha. Variadíssimas coisas se podem extrapolar, louvar e deplorar deste Domingo, como por exemplo...
- O PSOE tem dois berbicachos em mãos para resolver. Em primeiro lugar, conquistar uma opinião pública que não lhe ofereceu a vitória por se ter deixado seduzir pelo seu programa eleitoral. Mais que votar com a cabeça ou o coração, os espanhóis votaram com o estômago e contra a repugnância que lhes causou a tentativa de instrumentalização dos atentados de 11 de Março. O Governo agora cessante já antes mostrara a facilidade com que recorre ao golpe baixo, à desinformação e à irresponsabilidade, com o caso Prestige, e tratou de o confirmar agora. Assacar as responsabilidades do atentado à ETA escassas horas após o acontecimento, transformar esta tese em versão oficial e contra toda a informação que ia sendo disponibilizada acabou por condenar irremediavelmente o PP. Foi, claramente, esta manipulação que penalizou o PP, e não a condenação do envolvimento espanhol na 2ª Guerra do Iraque (como, provavelmente, alguma esquerda aproveitará para proclamar). O segundo problema (embora menor) será o de conciliar a promessa eleitoral de retirar as tropas espanholas do Iraque com a nova realidade surgida depois dos atentados. Cumprir a promessa é dar uma vitória dolorosa aos terroristas. Presumo, porém, que o novo Governo irá (e bem) argumentar que a situação mudou e manter a sua presença no terreno, embora possa reformular as bases em que ela se processa.
- O PP tem a sua imagem irremediavelmente manchada. Não só a sua nova direcção, cuidadosamente preparada para suceder a Aznar, levou uma tareia memorável nas urnas, como o próprio Aznar sai fortemente diminuído no seu prestígio. Afinal, foi o seu governo que tratou com os pés a memória das vítimas dos atentados...
- A participação eleitoral subiu 8% em relação ao último acto. Os espanhóis, colocados perante uma situação que consideraram inadmissível (a tentativa de manipulação e instrumentalização de uma situação humana dolorosíssima), exerceram o seu dever cívico e usaram-no para expressar de forma inequívoca o que sentiam a este respeito. Uma lição para os portugueses que, há uns anos atrás, preferiram a praia ou a esplanada quando foram chamados a pronunciar-se sobre uma questão humana igualmente grave (e que assim se mantem): a do aborto.
Arrotos do Porco: