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Vareta Funda

O blog dos orizicultores do Concelho de Manteigas


segunda-feira, fevereiro 20, 2006

Coisas que me passam pela cabeça ao ouvir o “20 anos” do José Cid

Durante os meus primeiros anos, o quarto dos meus irmãos não era o meu quarto – mas, enquanto o dia durava, funcionava como a minha sala. A minha casa era particular, nesse aspecto: na maior parte das casas, a cozinha e a sala são os “pontos focais”; na nossa, a esses dois juntava-se mais um, que era o quarto dos meus irmãos. Tinha duas camas de corpo e meio (sempre gostei desta terminologia, deste vislumbre de utilidade na perspectiva de se ter meio corpo que não se sabe onde se há-de pôr), uma escrivaninha com uma cadeira, um guarda-fatos (nunca gostei do termo roupeiro) e a máquina de costura da minha mãe. Que eu ainda sou do tempo em que as mães tinham máquinas de costura. E as sabiam usar. Havia um candeeiro de tecto com globo amarelo com motivos florais pintados e havia um candeeiro sobre a escrivaninha, daqueles de metal com braço flexível. As camas tinham umas cobertas de lã (sim, também prefiro dizer cobertas a dizer colchas) brancas e verdes, bonitas e macias, ainda que, por vezes, alguns fios de lã se prendessem às rodas dos meus carrinhos, estragando ou uma coisa ou outra. No chão, de tacos de madeira, estavam uns tapetes de lã, brancos, que a minha mãe manteve sempre escrupulosamente limpos – “que ideia a minha, tapetes brancos para um quarto de rapazes…”.
O meu quarto tinha uma mobília de casal, grande e ornamentada. Gostava dele, mas não tinha o ar “coloquial” e propício à brincadeira que tinha o dos meus irmãos. Guardava alguns brinquedos no meu quarto, mas raramente os usava ali. As camas dos meus irmãos, impecavelmente feitas a cada manhã pela minha mãe, ou os ditos tapetes brancos eram os sítios onde eu gostava de brincar (se não pudesse estar no terraço, a jogar às caricas ou à bola, partindo uma plantazita ou outra…). Ou onde eu gostava de ler. Ou onde eu gostava (?) de fazer os trabalhos de casa. Onde o LEGO servia invariavelmente para fazer casas. Onde a Garagem GALP levava uns sopapos sempre que a parva da corda do elevador se ensarilhava. Onde um ou outro boneco do Subbuteo ficou esmagado debaixo de uma mão menos cautelosa. Onde o Monteverdi que os meus pais me ofereceram nas férias de Albufeira ganhava todas as corridas de carros (até que o meu irmão mais velho me ofereceu uma réplica de um Ligier, vencedor incontestado nem que partisse com dez voltas de atraso, sempre “conduzido” pelo Jacques Laffitte…).
Foi ali que li os primeiros livros. “Os Cinco na Bela Vista” foi o primeiro. O meu irmão do meio estava a lê-lo em voz alta, que eu ainda era iletrado; pousou-o por qualquer motivo e eu peguei nele e comecei a ler (parece que se passou o mesmo com o meu irmão mais velho, pelo menos… os Vareta podem não ser homens de letras mas têm-nas no sangue). Foi ali que escrevi as composições que eram pedidas na escola; as primeiras cartas; as primeiras histórias.
As portas, largas e com vidraças grandes, que davam para a varanda, eram o meu refúgio, tapado pelas cortinas brancas, quando queria cantar ou chorar sem que ninguém visse. Cantava muito, não sei se mal ou bem – fazia-o sozinho, por pudor. Serviu-me, pelo menos, para aprender inglês, esforçando-me no “sing-along” com alguns dos discos dos meus irmãos. A música ia-me marcando a vidinha na aparelhagem Waltham, made in Ireland – ou no imorredouro rádio Siemens da cozinha.

Numa tarde de Inverno, daquelas em que a noite caiu mas ainda se sente que é de tarde, eu estava a brincar numa das camas com um carrinho dos bombeiros – teria os meus 6 ou 7 anos. A minha mãe estava a trabalhar com a máquina de costura, cantarolando, e a única luz que havia no quarto era a do candeeiro de metal que, desta vez, não estava sobre a escrivaninha mas sim sobre a máquina (OLIVA, claro, que a Singer era coisa mais moderna). A minha brincadeira era simples: andar com o carrinho sobre a cama; mas estava a gostar e nenhum fio de lã se estava a querer prender. O barulho da máquina de costura e a voz da minha mãe misturavam-se de uma maneira doce. A dada altura, o meu pai chegou do trabalho e veio ao quarto e beijou a minha mãe e depois a mim. Sentou-se um bocadinho na outra cama e conversaram sobre isto ou aquilo numa conversa sorridente e tranquila. Depois, foram os dois tratar do jantar e eu fui para a sala, ver “a animação” (dava às 18h, não era?). Senti-me tão seguro, tão protegido, tão confortável, tão tranquilo… Não era a alegria esfuziante das crianças que eu experimentava; era uma felicidade mais serena e mais bonita, sem causa ou efeito particular ou espectacular.
E pronto. Não sei dizer qual foi o “segredo” que me foi passado mas, muito mais do que uma memória agradável, essa tarde deixou-me cristalizado esse estado de espírito e uma imunidade a piores disposições que vêm durando há quase um quarteirão de anos e que sobrevivem à distância do quarto onde nasceram.

Arrotos do Porco:

meu querido menino :)))*******

a minha mãe tinha uma oliva e agora temos uma singer! :D
e sabemos usá-la!
eeeehhhhhhhh!


tens um mimo aqui
;*



EHHHHH! O mano! EHHHHH! Pois... desculpa lá. O Ferrari nunca tinha hipóteses. O Lotus, o Williams, o Alfa Romeo e o Brabham ainda podiam discutir alguma coisinha, por esta ordem, mas o Ferrari...
(e esqueci-me de referir a mesa de cabeceira com as tuas medalhas!).

Grande abraço.



Não que tu precisasses mas as saudades adoçaram-te a escrita.
Toma lá um beijinho e um abracinho. :)





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